terça-feira, 17 de agosto de 2010

ENTREVISTA - Em Tempo

25 a 31 de maio de l979



Às vésperas do dia 1o. de maio de 1979 veio a público um documento contendo um anteprojeto do Partido dos Trabalhadores. Lula não escondeu sua discordância em relação ao momento em que o texto foi divulgado. Nesta entrevista ele discute os pontos básicos que, no seu entender, deveriam orientar a criação do PT.


- Como você se situa diante do episódio de lançamento do anteprojeto do Partido dos Trabalhadores, que veio a público às vésperas do 1o. de maio?
- Eu não tenho falado muito a respeito do Partido dos Trabalhadores, porque eu sempre achei que nós não devíamos misturar o nosso movimento com qualquer outra palavra de ordem. Porque os trabalhadores poderiam entender que estivéssemos querendo fazer um partido através do movimento. Acho que as movimentações de São Bernardo foram muito mais importantes do que a discussão sobre o partido. Eu disse aos companheiros que lançaram aquele esboço de um programa que a coisa foi muito precipitada, porque entendo eu que deveríamos procurar outros setores da sociedade antes de lançarmos qualquer coisa. Caso contrário você corre o risco de causar inveja, de causar ciumeira, e a pessoa pode depois até ficar ofendida por não ter participado daquele esboço de programa, não ter tido tempo de discuti-lo e melhorá-lo.


- Quais setores da sociedade você acha que deveriam ser procurados para a discussão?
- Todos aqueles que vivem de salários, intelectuais, advogados, etc. E não podemos perder de vista que nós temos um grupo de políticos hoje dentro do MDB, elementos sérios, que sem dúvida poderiam participar dessa discussão. Temos também outros grupos de políticos que estão aí, cassados, afastados, que sequer participaram da coisa.

Eu acho que poderíamos ter dado uma amplitude maior ao lançamento , sabe? Deveríamos ter discutido mais com lideranças sindicais, feito com que mais companheiros participassem da cosia. Isto para que, quando saísse, saísse como uma coisa grande, e não como um projeto pequeno. Se tivermos que lançar um partido de assalariados juntando todos os setores da sociedade que vivem de salários, teremos que conversar com todos os setores da sociedade para que cada um dê sua opinião e, a partir daí levar a coisa para discussão nas bases.

- Você disse  ‘’se tivermos...’’ por quê? O que se deu matou a idéia? Ou trata-se de como ela deveria ser tocada daqui para diante?
- O que eu estou dizendo agora é a minha idéia sobre como deveria ter sido feito e... é como deverá ser feita outra vez, se quisermos fazer um lançamento com repercussão nacional. É imprescindível a nossa ida ao Nordeste e a qualquer outro ponto do Brasil para conversar com as lideranças em cada lugar, para saber se estão de acordo, se aquilo é viável, se podem contribuir para melhorar. Porquê nós não podemos lançar um partido de duas ou três pessoas, a partir de meia dúzia de pessoas.


- Essa reorientação do lançamento se coloca para você como uma tarefa para já? Quais são os próximos passos?
- Eu não sei se o momento é já. Tenho mantido contato com várias pessoas sobre a idéia de lançamento de um partido. Antes de lançarmos temos ainda que conversar com muita gente, principalmente com dirigentes sindicais em vários pontos do país. E a participação das bases não pode se dar apenas a partir do lançamento de um panfleto na porta da fábrica, a partir do momento em que você entrega um jornalzinho, o qual já veio até comprometendo o próprio partido... a própria tentativa de criar o partido, sabe quando já vem com a estampa de um grupo que não tinha o direito de apresentar um partido do trabalhador.

 
 - Mas eu insisto; estas orientações que você dá são para já ou não?
- Eu agora vou ter mais tempo de manter contato com pessoas com as quais eu vinha discutindo antes da intervenção. Vou tentar conversar com todos os companheiros dirigentes sindicais, vou tentar conversar com muito mais gente do que eu já tinha conversado, com outros setores da sociedade, com políticos que hoje fazem parte principalmente do MDB, que é onde tem um pessoal mais conseqüente. E a partir daí é que nós vamos discutir o dia de fazer o lançamento oficial de alguma coisa, e não fazer um lançamento assim, mais ou menos precipitado, que praticamente não causou nenhuma repercussão a nível nacional.



- Como você vê a participação nessas discussões de outros setores que não dirigentes sindicais e políticos? Por exemplo, as demais oposições populares, como o movimento estudantil, intelectuais, artistas, setores da Igreja, etc.
- Há uma certa dúvida por parte das pessoas quando falamos de um partido de assalariados. O cara que ganha CDRT$ 90.000,00 por mês se pergunta: pô, será que sou assalariado ou não, né? Esta é uma confusão generalizada que não tem o menor sentido. O que eu acho é que mesmo o nome sendo Partido dos Trabalhadores – e para mim o nome também não importa que seja PT, o que importa é que o nome tenha uma vinculação com a classe trabalhadora – o que vai definir muito mais a participação de alguns setores num partido é o próprio programa do partido, é a linha ideológica que se dê a esse partido. Não se pode de maneira alguma excluir estudantes, setores da Igreja, profissionais liberais, que de fato venham fazendo uma oposição conseqüente. Além do nome do partido, além de ser um partido da classe trabalhadora, é seu programa que vai definir quem é quem. Jamais um patrão entraria num partido deste.



- Já que você se refere tanto ao programa, qual sua opinião sobre o anteprojeto de programa que veio a púbico?
- Eu tinha participado de várias reuniões definidoras do programa; depois foi tirada a comissão para redigi-lo. Agora, eu somente li o programa muito rapidamente; sequer tive tempo de discutir com outros companheiros o texto. Na minha opinião o programa está quase bom. Está quase bom dentro da minha linha de raciocínio. Agora eu não sei se o sindicato do Rio, o de Alagoas, etc., acham que está bom. É isto que eu acho que deveria ter havido uma maior discussão antes do lançamento.


- Na sua estrita opinião pessoal, o que faltaria para o programa ficar cento (sic) por cento bom?
- Olha, eu prefiro não dar a minha opinião pessoal sobre o que faltaria. Faltam alguns enxertos, algumas melhoradinhas, e principalmente mais discussões com outros setores para , a partir daí, lançar o programa para as bases. Em seguida realizar atos públicos ou mesmo congressos, simultâneos em vários Estados, para então chegar à coisa definitiva. Mas na minha opinião ele está quase bom...


- Durante a campanha salarial de São Bernardo ficou acertado numa das assembléias que, passada a campanha, seria convocada uma discussão específica sobre o partido na categoria. Isto é para quando?
- Eu acho que antes de fazer qualqauer coisa, é necessário conversar com muita gente. Existe muita gente boa por aí para ser consultada. Eu vou dar alguns exemplos: querer criar um partido hoje impõe necessariamente conversar com um cara como o Jarbas Vasconcelos, que tem uma enorme liderança no Nordeste. Você teria que ir lá discutir com ele: “Olha Jarbas, gente está tentando fazer isto e gostaríamos de saber qual a sua opinião, se você topa discutir ou não”, teria igualmente que ir ao Rio de Janeiro, pegar um cara bom dentro do MDB e dizer as mesmas coisas; saber dele o que ele acha. Teríamos que fazer o mesmo com um Chico Pinto; teríamos que discutir também com o Comando de Greve dos Professores. A partir daí, então, fazer uma reunião grande com umas 100 ou 200 pessoas, específica, fora do sindicato, onde então ninguém vá usar o dinheiro do sindicato para isso. Como cidadãos estaremos discutindo a formação de um partido político.


- Qual a sua opinião hoje diante do PTB, PS, MDB? Enfim, você os avalia da mesma forma que há meses atrás, ou sua visão das articulações partidárias dentro da oposição mudou recentemente?
- Não, não... minha visão não está nem um pouco modificada recentemente.

 

- Você não estaria como que apostando numa convergência de setores destas articulações em direção a uma fusão como o PT?
- Não, eu não penso em setores de nada; eu falo simplesmente em pessoas que têm liderança para poderem(sic)  tentar compor alguma coisa. Até eu discutia lá em Osasco, outro dia, que a criação de um Partido dos Trabalhadoresp precisaria de uma vez por todas acabar a com as máscaras de PC, de PCdoB, de MDB, os e outras coisas mais. E que tentasse fazer um programa buscando unir. De forma que quando a pessoa entrasse para o partido vestisse uma camisa nova. Não podemos fazer um partido dentro do qual existam vários grupinhos. Nós iríamos apenas criar um MDB com outro nome, e não é isso que a gente quer.


- Mas não te parece que um partido amplo dos assalariados hoje, no Brasil, necessariamente seria bastante heterogêneo? E isto obrigando a que ele praticamente viesse a se constituir numa espécie de frente, ainda sob um denominador comum mais avançado e popular que o MDB?
- Não, eu acho que não. Exatamente por ser um partido que os assalariados enquanto maioria dominarão – por serem inclusive a maioria da nação -, eu acho que a tendência é mesmo a de criar um partido.



- A história, não só mundialmente mas também no Brasil, tem demonstrado que são inevitáveis as divisões ideológicas mesmo no seio da classe trabalhadora, apesar da base econômica desses indivíduos ser homogeneizadora, enquanto assalariados pelo capital...
- Mas quem sabe a gente possa acabar com tudo isso que é clássico na história e fazer um negócio menos clássico e mais realista, a partir de um momento em que as coisas possam ser encaradas sem roupagens ideológicas, tirando tudo quanto é máscara e partindo para enfrentar concretamente os problemas reais da classe trabalhadora.

O que não deve haver é preconceito e divergência simplesmente porque fulano ideologicamente é aquilo e beltrano é aquela outra coisa. Para que esse partido funcione, então, será necessário uma grande democracia interna, para que as discussões possam estar ao alcance de todos e não somente das cúpulas, como foi e tem sido prática dos partidos no Brasil. O importante é que não haja divergência só porque um é do PC, outro do PCdoB e outro da Arena, do cacete e não sei o que mais.

- Seria ingênuo acreditar ou esperar que cada um destes deixaria de ser o que é ao ingressar nesse partido. Assim, parece-me que o que você está querendo dizer é que esse partido deveria ser algo como uma frente única dos trabalhadores ou assalariados...

- Eu acho que na hora de brigar por determinadas coisas devemos esquecer que dentro do partido tem um cara que é isto ou aquilo. Devemos deixar de fazer grupinhos e unir-nos pela causa maior que está em questão. E se ainda assim houver divergências, então é o caso de resolvê-las através da discussão a mais democrática possível dentro do partido, tirando uma decisão e todos passando a acatar e a trabalhar em nome daquela decisão da maioria definida democraticamente.




2 comentários:

Valdecy Alves disse...

Olá!

Através dos nossos blogs, falamos ao mundo e já não somos uma ilha e nossa voz se irradia para consciência coletiva de toda a humanidade. Não deixe de Ler matéria e ver fotos em meu blog de como utilizar a arte para criar uma consciência de preservação do patrimônio histórico material e imaterial. MANTER VIVA A MEMÓRIA É UMA QUESTÃO DE IDENTIDADE, UM DIREITO HUMANO. Ainda de estar convidad@ para audiência pública, que se realizará sábado, dia 28/08/2010, nos Casarões da Barragem, onde houve o Campo de Concentração da Seca de 32, em Senador Pompeu, Ceará. Leia, veja, comente e divulgue:

www.valdecyalves.blogspot.com

Anderson Leite Lima disse...

Vejo nos últimos meses pintarem a candidata Petista à presidência da República como sendo a Besta do Apocalipse descrito na bíblia.
E vejo também pintarem o candidato Tucano a Presidência da república como sendo quase um santo milagreiro que merece ser beatificado.
Nossas eleições nacionais dividem a ignorância populacional.
Afinal, seriam eles o Deus ou a Besta, descritos na bíblia?
Sinceramente, procuro ficar imparcial até a hora de decidir meu voto.
Leio cada notícia, cada artigo, que fico me perguntando:
Até quando os rumos políticos brasileiros ficarão nas mãos de partidos gananciosos?
Ajudem este pobre analfabeto político, digam, mostrem-me um único candidato que mereça ser exaltado.
A bem da verdade PSDB, PT e PMDB denigrem e sujam a imagem política nacional.
Esses 3 partidos citados acabaram com a oposição no país.
Senão vejamos:
PT e PMDB x PSDB e DEM, o final da história todos sabem.
Caso o PSDB e DEM vençam, a primeira coisa que será feita é a compra imediata do PMDB, com cargos públicos e mimos políticos.
Daí, apenas o PT ficaria na oposição.
Existe oposição inferiormente numérica?
Não! Penso que é um crime o que fazem com o povo.
Já pararam para pensar? Em 16 anos, e dois governos distintos, em todos, o PMDB foi mandante de alguma casa do povo, seja a Câmara ou o Senado.
Quantos escândalos envolvendo estes presidentes do congresso nacional nós presenciamos?
Espero que haja reforma política, e que pensemos em algum plebiscito que proponha apenas 2 partidos ou no máximo 3 partidos políticos, pois assim fortaleceríamos a democracia.


Anderson Leite Lima