sábado, 7 de abril de 2012


ESTA É APENAS UMA PARTE DO PRIMEIRO DISCURSO QUE CONSTA DO LIVRO. COMENTÁRIOS E RESTANTE SERÃO COLOCADOS DEPOIS, POIS O DISCURSO É IMENSO. VÁ FALAR TANTO ASSIM LÁ NA ""CAIXA PREGO""!

No dia 14 de março de l979, os metalúrgicos do ABC entraram em greve. No dia 22, no estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, Lula submeteu a uma assembléia de 90.000 trabalhadores um documento assinado por representantes dos patrões e a volta ao trabalho e a constituição de uma comissão integrada por representantes dos trabalhadores, dos empresários e do governo, para estudar, num prazo de 45 dias, um acordo que  pusesse fim ao movimento grevista. 

Nesta assembléia, depois de destacar o significado do comento e de advertir pra o  risco de uma intervenção, Lula colocou-o em votação, e ele foi rejeitado.  No dia seguinte, os sindicatos de São Bernardo do Campo e Diadema, Santo André e São Caetano do Sul sofreram uma intervenção federal. 



Companheiros:

Hoje teremos que tomar aqui, quem sabe, uma decisão muito mais importante ainda do que a decisão que tomamos de entrar em greve.


É importante, muito importante mesmo, que vocês prestem atenção nesse documento.  Esse documento foi feito ontem à noite, datilografado hoje e o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema, o Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André e o Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano se comprometeram a trazer este documento para apreciação desta assembléia. E não poderia deixar de ser diferente porque, desde que começamos este movimento, tudo o que foi discutido , tudo aquilo que nós ouvimos dos empregadores, a gente trouxe aqui à presença dos senhores, e a diretoria e a comissão de salários se submeteram à decisão máxima deste plenário.


Eu vou ler o documento e vocês prestem bastante atenção porque, antes de eu colocar a minha posição pessoal e a minha posição de presidente do sindicato darei uma série de explicações sobre este documento.


“Na presença do Excelentíssimo Sr. ministro do Trabalho, Dr. Murilo Macedo, os Sindicatos dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas e Mecânicas e de Material Elétrico de São Bernardo do Campo e Diadema, Santo André, Mauá, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra e São Caetano do Sul, e os Sindicatos Patronais do 14º grupo, Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico, mais a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, procurando conjuntamente soluções elevadas e patrióticas para o problema gerado pelas paralisações do trabalho na região ABC, deliberaram formar um acordo nos seguintes termos: 

1º) Entre os sindicatos metalúrgicos de empregadores e de empregados deliberou-se que os trabalhadores concordam com o retorno ao trabalho e que será assinado o protocolo de intenções já firmado por uma parcela da categoria com as ressalvas constantes das letras seguintes: 

a)         Fica criada uma comissão tripartite, integrada por representantes dos trabalhadores, dos empresários e do governo, com a finalidade de estudar, dentro do prazo de 45 dias, o item 2º do referido protocolo, que dispõe sobre o reajuste salarial dos empregados de empresas que concederam aumentos salariais reais por acordo ou outra forma, entre 2 de abril de l978 e a presente data. 
b)         A representação dos trabalhadores na aludida comissão tripartite será constituída pelos sindicatos profissionais signatários deste acordo e poderá contar com um representante dos signatários do protocolo de intenção.
c)         Competirá ao governo através da ação mediadora do ministro do Trabalho, estabelecer a solução conciliatória, em havendo divergência entre as partes.
d)         Os empresários assumem o formal compromisso de não aplicarem penalidades de quaisquer natureza, inclusive demissão, aos empregados que participaram das paralisações gerais, e durante 120 dias, havendo demissão por outro motivo, será ela comunicada por escrito ao trabalhador dispensado, com as razões determinantes da dispensa.
e)         O valor relativo às horas paradas será adiantado aos trabalhadores mediante vales, os quais serão resgatados no mínimo, através de cinco parcelas, de igual valor à primeira, começando no mês de maio.

2º)  Por sugestão do Sr. ministro do Trabalho, as partes se incumbem de encaminhar ao governo estudos referentes à legislação do FGTS e da estrutura sindical, dentro de 240 dias; da legislação de greve, da nova sistemática da representação sindical e do sistema de negociação coletiva, dentro de l80 dias para análise do Ministério do Trabalho e eventual encaminhamento ao Congresso Nacional de mensagens governamentais que possam resultar em novos instrumentos legais para a regulamentação dessa matéria.

A assinatura deste acordo manifesta o compromisso das partes em levá-lo para a discussão nas assembléias.”



Então, os três sindicatos assinaram este documento, comprometendo-se a trazê-lo para a apreciação da assembléia. 

Agora, algumas explicações que eu acho fundamentais. Peço aos companheiros trabalhadores que prestem bastante atenção. (FEZ COM QUE OS OPERÁRIOS SE SENTISSEM IMPORTANTES, E OUÇAM SUA VOZ).

Vocês viram que a proposta não prevê o aumento imediato de nosso salário.  O que se pede nesse documento é que os trabalhadores voltem a trabalhar de imediato. Dentro de 45dias, a partir da volta ao trabalho, serão discutidos os nossos 11%. Companheiros, deixem eu dar todas as explicações, pois tem muitas explicações, tem muitas mesmo. Diz também o documento que sequer as horas que nós ficamos em greve serão pagas. Essas horas serão descontadas em cinco parcelas, a partir do dia 10 de maio.  Diz também esse documento que as outras coisas, o delegado sindical e outras reivindicações que nós fizemos, serão discutidas apenas, quem sabe, a partir de 180 dias, e algumas a partir do primeiro dia.


Eu queria que vocês entendessem uma coisa muito importante.  Desde o primeiro dia, desde a primeira assembléia que nós fizemos, no sindicato ou aqui, eu disse a vocês que a diretoria do sindicato e a comissão de salários iriam até às últimas conseqüências para conseguir  o nosso aumento de salário.  Gostaria que os companheiros deixassem para se manifestar na hora em que eu terminar as explicações que eu considero de muita valia para todos os trabalhadores.


O Ministério do Trabalho teve, na minha opinião, um comportamento exemplar. Eu nunca tinha visto, nunca – desde ll972 que eu estou no sindicato e desde l975 que eu sou presidente do sindicato - , eu nunca vi um ministro do Trabalho com posições tão honestas  como foram as do Murilo Macedo.  Entretanto, eu nunca vi, mesmo, tanta safadeza como eu dos empresários.

Eu já disse a vocês que os 11º serão discutidos – segundo proposta deles – a partir do nosso retorno ao trabalho.  Entretanto, eu gostaria de alertar os companheiros para uma coisa.  Ontem, pelo menos todos os que estão aqui, ou pelo menos aquelas quase três mil pessoas que se encontravam no sindicato estavam preocupadas, estavam muito preocupadas com uma coisa chamada “intervenção no sindicato”.  Não foram poucos os companheiros que, quando eu cheguei às três e meia da manhã, me procuravam pra saber se iria realmente haver intervenção.  E aqui na assembléia ontem à tarde, os companheiros do Sindicato de Santos, os companheiros do Sindicato dos Petroleiros de Paulínia alertavam os companheiros para irem ao sindicato, porque corríamos o risco de uma intervenção.

CONTINUA...

quinta-feira, 5 de abril de 2012

DISCURSOS - Segunda parte do livro

  

"Este livro foi editado pelo Núcleo Ampliado de Professores
do Partido dos Trabalhadores-PT, de São Paulo"  



Se as entrevistas mostram com clareza a evolução do pensamento de Lula, seus discursos constituem uma prova cabal de sua profunda identificação com a classe trabalhadora, principalmente os metalúrgicos que ele representa através do Sindicato de São Bernardo do Campo e Diadema.  As campanhas salariais conduzidas pela diretoria desse sindicato representaram os momentos cruciais da mobilização dos metalúrgicos do ABC a partir de l978.  Não há dúvida de que essa mobilização teve como um de seus suportes básicos a palavra de Lula.  Falando a seus companheiros numa linguagem direta, clara, por vezes rude, Lula revelava-se não um mestre, mas um igual, um membro do mesmo universo de necessidades, lutas e trabalhos. Ouvindo-o, os trabalhadores ouviam sua própria voz.
Nas assembléias convocadas durante as campanhas salariais, a maioria reunindo dezenas de milhares de trabalhadores – algumas alcançando perto de 100.000 pessoas -, os discursos de Lula foram sempre decisivos quanto a orientação das campanhas e ao comportamento a ser adotado pelos metalúrgicos.  E mais do que isso, é nessas assembléias que, através de pinceladas cruas e realistas, Lula tem revelado a seus ouvintes  o que todos eles conhecem  mas poucos conseguem discernir com clareza:? Os traços cruéis das relações entre capital e trabalho.

A coletânea apresentada neste livro, embora incompleta e contendo discursos truncados pela impossibilidade  de reconstituição integral, mostra de modo claro e suficiente a identidade  de pensamento e ação entre Lula e a classe trabalhadora. A divulgação desses discursos poderá contribuir para aprofundar a reflexão sobre a dura realidade da classe trabalhadora brasileira, mas deverá sobretudo constituir um instrumento capaz de fazer avança a mobilização (avançar rumo à vida política seria mais correto) iniciada em São Bernardo, para a qual a palavra de Lula deu força decisiva.


sábado, 11 de fevereiro de 2012

Entrevista a 'Em Tempo'




10 a 16 de janeiro de 1980.
Lula concedeu esta entrevista três meses antes da greve decretada pelos metalúrgicos no dia 1o. de abril de l980. Aqui ele fala das inovações introduzidas na campanha salarial do ano.
A proposição de estender a luta dos trabalhadores para outros pontos, além da reivindicação por um percentual de aumento, é a primeira inovação apontada por Lula. Ele passa a falar então sobre esses outros pontos e a explicar por que eles são importantes. Analisa também as possibilidades de vitória, faz considerações sobre a mobilização dos trabalhadores em torno das novas reivindicações e fala de sua expectativa quanto à greve nessa campanha.



- Tem sido dito que a campanha de São Bernardo, para o próximo ano, vai inovar em termos do que vem ocorrendo até agora neste ciclo grevista. Como é que está a coisa?
         - Além das reuniões por empresa que cada diretor do sindicato vem fazendo, tirando nomes de companheiros que serão os porta-vozes das propostas do sindicato dentro da empresa e que vão integrar as comissões de negociação, nós estamos tentando inovar, mostrando para o trabalhador que existem algumas brigas mais sérias do que simplesmente por um percentual. Nós temos dito que não adianta o trabalhador obter um bom aumento, se daí a um certo tempo ele é dispensado e quando se emprega novamente volta a receber 40% ou 60% a menos do que antes.
          Em função disto vamos tentar dar ênfase à garantia do emprego e ao salário profissional.
          No Brasil não existe uma definição profissional. Existe aquela feita pelas empresas, mas não uma que o trabalhador apresenta e luta por ela e a reconheça. As empresas dividem os trabalhadores como bem entendem e instauram assim uma concorrência entre eles. E mais, dentro de uma mesma definição profissional estabelecida pela empresa, por exemplo, a de ferramenteiro, você encontra salários desde Cr$ 59,00 até Cr$ 103,00 por hora.
          Este trabalhador de Cr$ 103,00, quando despedido, volta a se empregar com um salário muito mais baixo. Enfim, o trabalhador está sempre começando da estaca zero.
          É como na brincadeira do pau-de-sebo. As empresas colocam o salário teto no alto e põem os trabalhadores brincando de quem chega lá em cima. Assim, vamos lutar na campanha para estabelecer um salário profissional que seja a média dos salários existentes; ou seja, um piso profissional. Não vamos estabelecer um teto, pois isto é questão de capacidade ... de briga dos trabalhadores, é questão da oferta e da procura.
          Esta conquista tem outro lado, que é o de diminuir o medo do trabalhador de ser mandado embora da empresa, uma vez que ele sabe que seu novo emprego não irá remunerá-lo irrisoriamente.
          Enfim, há várias reivindicações que estão latentes no interior das empresas e que devem ser levadas em conta. Por exemplo, a oferta de transporte para o trabalhador, por todas as empresas. Há um mundo de safadagens dentro das empresas que tem que vir à tona.

- Você acredita que estas reivindicações tenham mais chances de vitória?
         - Isto não; toda reivindicação é uma luta. Esta agora é mais sustentável nas discussões com os patrões. Um percentual de 90%, por exemplo, é mais retrucável pelo empregador dizendo que não agüenta, que o culpado das perdas foi o governo, etc. Agora, o piso profissional se escora na lei que diz que para trabalho igual, salário igual.


- Você acha que este tipo de campanha mobiliza mais? Qual sua excpectativa quanto às futuras assembléias?
          - Esta campanha será mobilizadora a partir do momento em que tivermos capacidade de mobilizar os trabalhadores . Aqui em São Bernardo há uma certa frustração das pessoas que se habituaram a ver, durante 15 dias, 90000 pessoas em assembléias. E as pessoas já têm dificuldades em fazer reuniões com pequeno número de trabalhadores. Mas 90000 em um campo de futebol é um resultado de anos de pregação. E quando começam os métodos novos, com inovações na campanha, há que dar tempo. Mas o importante é a criação de uma consciência de reivindicações nos trabalhadores. Por exemplo, o trabalhador tem que compreender bem a figura do delegado sindical; ela tem que deixar de ser uma reivindicação apenas de dirigentes.


 Qual sua espectativa quanto à greve na campanha?
          - Estamos preparando uma campanha salarial e os resultados dela é que levarão ou não os trabalhadores à greve. Todos gostaríamos de fazer um bom acordo sem ser necessário chegar à greve, pois a greve não é um fim, mas sim um meio para se conseguir determinados acordos sem greves. Agora não sei a forma em que será feita a greve. Vamos jogar algumas idéias para os trabalhadores e vermos se é possível chegarmos a algumas formas de pressão dentro das empresas antes de chegarmos às greves gerais.


 Em Tempo, 10 a 16 de janeiro de l980




quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Entrevista a Escritra/Ensaio nº 5,1978 *


* O título está exatamente
como colocado no livro.
 

Entrevista concedida a Maria Te
reza Ribeiro

Um assunto extremamente importante é abordado nesta entrevista: o papel da mulher na sociedade de hoje. Lula afirma que a luta da mulher deve ser conduzida em comum com a do homem, “porque não existem dois tipos de exploração”. Segundo ele, “existe apenas um grupo de trabalhadores, homens ou mulheres, sendo explorados por um patrão”. Não nega porém que, por ser considerada uma força de trabalho secundária, a mulher é mais explorada do que o homem. Daí, admite existirem algumas reivindicações específicas da mulher.
Além desses aspectos, apresenta suas opiniões sobre a atividade doméstica da mulher e seu trabalho fora de casa, o controle da natalidade, o aborto, o machismo e o movimento feminista.

- Como se coloca a mulher trabalhadora na luta por melhores salários e melhores condições de emprego?   - Há testemunho dos próprios homens de que as mulheres estão com muito mais coragem de brigar do que os homens. E ainda: isso é importantíssimo porque elas são um estímulo para que os companheiros trabalhadores continuem brigando. Eu acho que a participação da mulher sempre foi e continuará sendo efetivamente igual ou melhor do que a do próprio homem, em qualquer tipo de luta que a gente trave em termos de classe trabalhadora.

 - Por que você diz que a participação da mulher é um estímulo para o homem?  - Porque a mulher sempre foi tida como o sexo fraco. Acho que em termos de luta de classes ela tem demonstrado exatamente o contrário. A mulher tem tanto ou mais valor que o homem na hora de ir para a briga. A gente tem que aceitar como verdade que a mulher do trabalhador, a esposa do trabalhador é, na verdade, um estímulo para o marido continuar na briga porque, se a mulher for contrária, o marido tende a fraquejar. Se a mulher for favorável, o marido tende a se tornar um baluarte na luta. E a gente tem tido em greves aqui na região alguns casos interessantes. Tivemos o caso de uma mulher que chamou o marido dela de covarde porque estava tentando fraquejar, não estava querendo participar da briga. Então eu acho que a mulher tem um papel preponderante, sabe, nas decisões do homem.

- A mulher trabalhadora tem, naturalmente, reivindicações próprias. Sua luta, por isso seria diferente da do homem?  - Acho que em termos de classe trabalhadora a luta deve ser comum, única, porque não existem dois tipos de exploração. Existe apenas um grupo de trabalhadores, homens ou mulheres, sendo explorados por um patrão. Eu acho que a luta se fixa aí.

- Mas há lugares em que a mulher faz o mesmo trabalho que o homem e tem remuneração inferior.  - É, existem dois aspectos ai. Primeiro, a mulher sofre as consequências do hábito da terra, não é, do hábito do país. Aqui ela é uma força de trabalho secundária, ela trabalha normalmente parta ajudar alguém, o marido, a casa e tal, não é aquela força colocada em primeiro plano, como o homem. Então, as empresas exploram muito esses aspecto, não é, elas contratam uma mulher para fazer o mesmo serviço que o homem pagando muito menos. Por outro lado, as empresas – a grande maioria delas – não estão adaptadas para ter mulheres, porque o banheiro de um homem não é igual ao banheiro de mulher. Não existe nada preparado especificamente para um trabalho feminino, um negócio mais asseado (?). É, são poucas as empresas que têm sanitário preparado exatamente para a mulher usar. Então, eu acho que existem algumas reivindicações especificas da mulher, mas o grosso da briga da mulher trabalhadora é o mesmo que o do homem. Não existe diferença.

 - O fato de ter uma atividade doméstica além de trabalhar fora influi na participação da mulher na luta dos trabalhadores? - Acho que influi, que cansa muito a mulher. Ela é muito mais judiada que o homem porque, além das tarefas domésticas, caseiras, tem o trabalho. E o trabalho doméstico é mais cansativo até do que muitos trabalhos de fábricas, porque é um trabalho muito repetitivo, quer dizer, e a mesma coisa todo dia, toda hora. Passam meses, anos, décadas, e a mulher fazendo o mesmo serviço. É enjoativo demais. Aí eu tiro pela minha mulher, né? Tenho certeza que ela preferiria estar numa fábrica a estar aturando a limpeza da casa, a bagunça que os moleques fazem.  Grande engano para quem, um dia, trabalhadou em uma fábrica, pois não há nada mais repetitivo do que o trabalho de um operário.

- Você acha que a mulher deve trabalhar?  - Eu acho que deve trabalhar. Veja, há dois aspectos que eu costumo analisar. Por exemplo, minha mulher trabalhou até nascer a criança. A partir do momento que ficou com três filhos, era impossível trabalhar. Portanto, enquanto tiver disponibilidade, a mulher deve trabalhar. O que eu acho é que os filhos não devem ser sacarificados, a educação do filho não deve ser sacrificada pelo problema do trabalho da mulher, sabe? Então, quando a pessoa trabalha por prazer é uma coisa, o duro é quando a mulher tem que trabalhar para sobreviver, porque ela coloca em risco a formação da criança. As crianças precisam mais das mães justamente nos primeiros anos de vida, né? Acho que toda mulher deveria evitar trabalhar na época da amamentação do filho, aquele negócio todo. Ou então, ao invés de ela evitar trabalhar, as empresas poderiam se aparelhar para receber a mulher que tivesse concebido um filho há poucos meses.

- Nesse sentido, como é que está a situação das creches?  - Depois do Congresso da Mulher Metalúrgica, o sindicato denunciou isso e passou a reivindicar a construção de creches, no máximo num raio de um quilômetro do local de trabalho. Mas isso não tem acontecido, porque a lei permite às empresas fazerem convênio e não existe a menor atenção à mulher.  Mudou alguma coisa depois de tantos de L.I. na presidência do país?

-As mulheres sabem que têm direito às creches?  - Há um fato muito gozado: quando a gente ganhou a estabilidade da mulher gestante, isso virou faca de dois gumes. Porque aí, quando a mulher que está grávida quer ser mandada embora, a empresa fala: Olha, não mando embora porque o sindicado não deixa. Nós já tivemos caso aqui de mulher que veio vazando leite, dizendo pra nós: Eu quero ser manda embora, não posso trabalhar, meu filho precisa mamar de duas em duas horas e como é que eu vou dar lei pro moleque? Nesse caso, o sindicato e que tem que cavar para a mulher ser mandada embora. O certo é ter creche dentro da empresa, um berçário para a mulher ir lá de duas em duas horas amamentar o filho. Quando muito a criança mama 15, 20 minutos. Não seria tão prejudicial para as empresas, que elas não pudessem ter creche dentro.

- Como você vê o controle da natalidade?  - E sou contra o controle da natalidade aqui no Brasil, que vive ainda com ¾ da sua extensão territorial ainda por ser habitada. Eu acho que a mulher trabalhadora tem tanto direito de ter filho quanto a mulher que não é trabalhadora, sabe? A arte de ter filho é uma coisa tão sagrada que eu acho que não deve ser proibida por lei.
- Não é melhor ela não ter cinco filhos do que deixá-los passar fome?  - Eu acho que a questão é educar o povo para não ter muitos filhos (?), não proibir. A formação cultural de um povo é que permite que ele tenha um filho ou 20. É uma questão de consciência, não só da mulher, mas do homem também, porque a mulher sozinha não gera um filho e, hoje, um homem sozinho já gera, é só usar o laboratório. Os nenês de proveta estão aí, porra. Então, a conscientização tem que ser muito mais do homem do que da própria mulher (?). E há inúmeros meios de se evitar filhos sem prejudicar a saúde da mulher como se prejudica hoje, tomando anticoncepcionais ou coisa parecida. Se eu tivesse condições de criar, de ter gente pra ajudar a educar, aquele negócio todo, eu seria um cara que tentaria convencer minha mulher - ela também adora criança e, como diz o matuto, minha mulher é boa parideira (?).Se a gente vivesse como há 20 anos atrás, com terrenos enormes, sem essa loucura que é hoje, eu seria um cara que teria pelo menos uns dez filhos. Quanta bobagem!  Ninguém controla o corpo de uma mulher, a não ela mesma, a não ser  quando é controlado por sua própria estupidez.
- O que você acha da legalização do aborto?   - Eu posso até ser mal interpretado, sabe, mas sou contra a legalização do aborto. Sou contra a legalização do aborto. Sou contra por dois aspectos, espera aí, sou contra não, minto, minto, minto. Eu sou a favor do aborto. Primeiro porque eu acho que a pessoa pode cometer um erro. Às vezes, nascer a criança é muito mais prejudicial do que praticar o aborto. O que não adiante é a coisa ficar na clandestinidade e acontecerem milhões de casos. Muitas vezes as pessoas perdem a vida arriscando-se a tomar remédios inadequados, arriscando-se a se tratar com pessoas incapacitadas. Então, seria muito melhor legalizar isso, sabe, dar condição de salvar pelo menos a vidas mãe. Para evitar que as mulheres tomem remédios feitos em casa, tentem ir atrás de feiticeiros, de chá de cobra, de enfermeiros, de parteiros, sei lá. O ideal seria que não precisasse ninguém abortar, mas, como existe essa necessidade, o aborto deveria ser legalizado.  Esse seu comentário atrapalhado sou contra e sou a  favor,  lembra um comentário feito por jornalista que fala sobre sua forma de se comportar na época de sindicalista. Dependendo do assunto, antes de discursar, ele colocava duas ou mais pessoas na ‘linha de frente’. Elas dariam opiniões contraditórias, rapidamente, enquanto ele observava a reação dos ouvintes para saber exatamente o que deveria dizer para ser bem aceito em seguida.

- O que você acha do machismo?  - Olha, eu acho que sou machista, e me orgulho disso, sabe? Penso eu o homem não é um ser superior à mulher. Mas ele tem que preservar certas coisas, né? Por exemplo, eu não aceito, por Deus do céu, esse negócio de muita liberdade com mulher minha. Quando eu era noivo, eu nunca fui chegado a ir num lugar e vir outro e abraçar minha mulher, beijar minha mulher, sabe? Eu procuro defender aquilo que é meu. Sabe, eu nem sei se isso é machismo, acho que é a arte de gostar. Quer dizer, eu, mesmo quando não tinha caso mais sério com uma mulher, sempre fui chamado de machista. Se ela não quisesse mais nada, então fosse embora, porque eu não sou chegado a - como se fala? – dividir. Nada daquilo que eu considero meu, principalmente em se tratando de mulher, eu gosto de dividir. Bem, portanto, eu sou machista, sou ciumento, eu não gosto que minha mulher fique zanzando não, não tem esse negócio de ir a festinha sozinha, não tem nada disso. E eu gosto que minha mulher seja assim comigo. Minha mulher é ciumenta, eu sou ciumento, acho que isso integra muito a gente., faz sentir que a gente quer tomar conta um do outro. O que não pode é  largar, como muita larga aí, né, e quando vai tentar pegar já não tem mais. Se isso é ser machista, eu sou machista. Penso que tem que ser dividida a responsabilidade: nem a mulher tem que ser mais do que o homem, e muitas vezes querem ser, nem o homem tem que ser mais do a mulher. Eu, por exemplo, quando minha mulher trabalhava, ela não sabia quanto eu ganhava; e ainda hoje é assim. Não que eu negue pra ela, é que nunca houve necessidade de eu contar. Se ela quiser saber, não tem problema nenhum. Minha mulher, por exemplo, não me pede dinheiro, nunca me pediu. Minha mulher é incapaz de mexer na minha carteira. Se eu mandar minha mulher abrir minha carteira, ela ao abre, sabe, ela pega para eu abrir. Portanto, num casal deve existir entendimento, isto é, nenhum querer ser mais do que o outro, nenhum querer dar provas de que é melhor do que o outro. Os dois unidos serão muito mais fortes do que os dois divididos. Então, se o marido e a mulher trabalham, no fim do mês devem juntar os dois pagamentos, parar as contas e ver o que sobra ou o que falta.
-O que você acha do movimento feminista?  - Não entendo bem o que é o movimento feminista, eu não sei qual é o seu objetivo. Penso que a mulher poder ser advogada, pode ser médica, um montão de coisas. Agora, você querer que uma mulher trabalhe numa picareta no meio da rua, pé querer acabar com a meiguice feminina. Deve existir alguma coisa na mulher pra cativar o homem. Assim, se você pega uma mulher de macacão no meio da rua, qual é o homem que vai sentir alguma atração por ela? E a mulher tem outros problemas: uma mulher que está amamentando um filho não pode estar na rua cavando buraco. Entretanto,o homem pode, o homem está livre disso. Daí eu achar que em algumas profissões a mulher tem condição de ser muito superior ao homem. Ela tem dado demonstração de que pode, entende? Agora, o que a gente percebe é que algumas feministas, com esse negócio de deixar o cabelo do sovaco crescer, são ridículas , né? Acho que é até questão de higiene. Tenho medo de que esse negócio de feminismo em algumas pessoas seja frustração, sabe? Agora, a mulher deve brigar pela independência dela, é o mínimo que pode fazer. Ela precisa começar a brigar dentro do lar dela, com os pais dela, precisa começar a brigar dentro do seu trabalho pra ser igual aos homens.

 - Qual a mulher ideal para você? - A minha.
 
- Você gosta de ser homem?  - Se eu tivesse que nascer outra vez eu gostaria de nascer homem. Acho que é melhor ser homem.
- Por quê?  - Por vários aspectos, sabe? O homem não tem a preocupação de ficar grávido, o homem não tem determinadas preocupações que são próprias da fêmea.

- Quantos filhos você tem?  - Três homens. Um de sete, outro de quatro anos e um de três meses. L.I. não citou a outra filha Lurian, que foi ‘descoberta’ pelos marketeiros da campanha de Collor, mas nem por isso ela deixou de se aproveitar das oportunidades oferecidas pelo pai quando se tornou presidente.  Além disso,  aí está a falsidade de L.I.:  para se fazer de bom moço, endeusou a maternidade, enquanto ignorava a filha que já havia nascido sem sua ""autorização""" .

 - Sua mulher trabalha em casa, não é, cuidando dos três filhos. Que você acha do trabalho dela?  - Olha, eu sinto muita pena do trabalho de minha mulher. Primeiro, porque a gente não pode ter empregada; segundo, porque eu chego em caso e sinto, na fisionomia da minha mulher, que está mais cansada do que qual quer operário que trabalhou o ia inteiro na fábrica. Porque não é brincadeira, não, cuidar da casa, lavar roupa, dar mamadeira, trocar a molecada. Realmente é um trabalho que cansa muito mais que numa fábrica. O trabalho que a mulher tem dentre do lar é muito mais dignificante que qualquer trabalho que outra pessoa possa fazer.

- O trabalho dela e tão importante quanto o seu?  - É mais importante que o meu. Sabe, o dela é a arte da agüentação, que eu não tenho aqui no sindicato, porque eu convivo com muitas pessoas, atendo muita gente, não fico bitolado e, em casa a mulher fica bitolada.

- Você acha que o trabalho de sua mulher é uma condição para que o seu possa existir, já que se preocupa com a casa?  - É, eu acho que é. Eu acho o seguinte: a minha mulher, se fosse pra ser remunerada, deveria ganhar até mais do que eu. Não só minha mulher. Qualquer mulher que cuida de um lar deveria ter um salário. A gente fala que é a mulher, mas, na verdade, as mulheres são tratadas como empregadas. São, porque, veja o problema da minha mulher. Eu saio de casa às 8 da manhã e chego em casa à meia-noite, todo dia. Quer dizer, chego em casa pra tomar banho, trocar de roupa, deixar roupa pra ela, sabe, e saio no outro dia de manhã. Não atenho tempo de brincar com as crianças, não tenho tempo de pegar a molecada no colo, quer dizer,praticamente eu só vou lá pra comer e trocar de roupa.
         Ainda aos domingos eu tenho eu tenho que receber jornalista, tenho que sair não sei pra quê, é aquele negócio todo. Na prática , minha mulher não precisa pedir dinheiro nenhum, porque eu vou deixando dinheiro em casa. O meu salário teria que ser dividido: X é teu e X é meu. Não ia mudar nada o tratamento pra com ela. Mas, lamentavelmente, a coisa não é desse jeito, a formação cultural de todo brasileiro ainda não evoluiu a ponto de o cara entender melhor o trabalho caseiro.Ele desvaloriza muito esse tipo de trabalho e eu digo isso porque, às vezes, sou obrigado a ficar em casa, né? Quando minha mulher foi ter o último filho, eu fiquei em casa com os dois moleques. Aí eu realmente fiquei sabendo o que é ser mãe, o que é tomar conta de uma casa.

 - Como é a educação de seus filhos?  - É um dos motivos pelo qual eu estou pensando seriamente em largar o sindicato. É que eu percebo que meus filhos sentem muito a minha falta. Acho que estou dando muita responsabilidade à minha mulher quanto à educação deles, quando eu deveria repartir essa responsabilidade. E não reparto não porque não quero, não reparto porque não estou tendo tempo de repartir esse tempo com minha esposa. Isso pode atrapalhar o crescimento das crianças, a educação delas, e eu preciso ajudar.


* Devido a um lapso involuntário,
esta entrevista foi incluída entre as de l979.
Sua publicação, na realidade,
ocorreu em 1978. (N.E.)
ESTA OBSERVAÇÃO ESTÁ NO LIVRO)


terça-feira, 24 de maio de 2011

"Entrevista" ao ABCD Jornal



 ABCD Jornal, dezembro de l979

Apresentação

Esta entrevista, bem pequena, mais parece um depoimento, ou melhor,  uma forma  de justificar sua entrada para a proveitosa política.  Nela, Luiz Inácio  faz uma balanço sintético mas muito preciso do movimento sindical nos anos 70. 

Ele considera os anos que vão desde 1970 até l977 como “um dos piores momentos do sindicalismo brasileiro”, e aponta a luta pela reposição salarial, em l977, como um marco no movimento sindical. A partir daí, Lula continua o balanço dos anos 70, mostrando a trajetória da classe trabalhadora que supera sua posição apolítica e toma consciência da necessidade de se organizar politicamente. Daí surge, cresce a e toma força a proposta do Partido dos Trabalhadores.

A década de 70 foi, até l977, um dos piores momentos do sindicalismo brasileiro. Nem diria tanto por causa do próprio regime militar implantado no país, mas também pela inoperância do movimento sindical. Com raríssimas exceções, o sindicalismo brasileiro se entregou ao assistencialismo, ao favoritismo dos dirigentes sindicais, esquecendo-se de agir como órgão de representação, de denúncia dos problemas que envolvem o trabalhador no dia-a-dia. A safadeza dos dirigentes sindicais se igualava à repressão.

Em l977 há a luta pela reposição salarial de 34, lula esta que surgiu muito mais pela necessidade de alguns dirigentes sindicais participarem do descontentamento de toda a sociedade – já tinham se mobilizado naquela época intelectuais, estudantes, empresários, funcionários públicos – do que qualquer outra coisa. É quando alguns dirigentes sindicais se conscientizam de que nada mudaria enquanto não houvesse participação efetiva da classe trabalhadora. A reposição salarial foi um marco.


A partir de então, passamos a denunciar para a classe trabalhadora que grande parte do que tinha sido dito a ela tinha sido mentira. Começamos um processo de valorização do trabalho no sentido de mostrar que as coisas só mudariam a partir do desejo dos trabalhadores. Começamos a mostrar as farsas do dissídio coletivo. E em 78 nem índice reivindicamos. Para mostrar aos trabalhadores que havia sido montado um esquema no Brasil para que o trabalhador acreditasse nas autoridades, na bondade dos empresários e nas mentiras que alguns dirigentes sindicais costumavam contar.

E surgiram as greves de 78, que abriram efetivamente os caminhos por onde os trabalhadores trilham até hoje. Se errado ou certo, se com sucesso ou não, a verdade é que os trabalhadores descobriram que somente parando as máquinas os patrões os temem. (interesse pelo poder, não pelos direitos) Porém, no final da década começamos a fazer a greve pela greve. Em alguns momentos se chegou a usar até um certo sadismo de que quem não fazia greve era pelego. E quem fazia, mesmo não dando certo, era considerado herói.

E não podemos deixar de lado o campo político. Realmente eu era um dirigente apolítico até 77. Foi só com as greves que percebemos a necessidade de participação política.  Vimos que os dois campos estavam muito ligados. Que não adianta ganhar 10% se quem está no poder tem meios para baixar uma política salarial para tirar todas as conquistas da classe trabalhadora.

Resumindo, eu diria que a década de 70, embora apenas com três anos de prática de sindicalismo, foi muito positiva por três coisas básicas:

1. os trabalhadores se redescobriram como único setor da sociedade capaz de propor uma transformação na sociedade.

2. Com este redescobrimento, quebramos de uma vez por todas com a lei antigreve e com uma lei de arrocho salarial.

3. Com tudo isso, descobrimos coisa ainda maior. Que não bastava passar por cima da legislação de exceção e fazer greve. Que não bastava quebrar a lei de arrocho, que só isso não iria solucionar o problema dos trabalhadores. Descobrimos então a necessidade da organização política do trabalhador para que servisse de amparo e de alternativa de organização. Daí a proposta do Partido dos Trabalhadores, PT.


ABCD Jornal, dezembro de l979
Entrevista concedida a Alzira Rodrigues


 

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Entrevista ao Jornal O Pasquim


Pasquim, 24 a 31 de março a l978



Apresentação



De todas entrevistas dadas por Lula, esta é uma das mais longas já publicadas. Nela são abordados bordados vários assuntos: liberdade sindical, garantia de emprego, imposto sindical, FGTS, rotatividade de mão-de-obra, participação nos lucros da empresa, além de muitos outros.



Lula fala ainda de episódios difíceis por que passou, como sua vinda com sete anos para São Paulo, em um pau-de-arara, numa viagem que durou 13 dias. Mas conta também fatos pitorescos de sua vida, como o encontro com sua mulher.



Nesta entrevista podemos ver suas críticas à legislação trabalhista e a resposta que dá àqueles que o criticam por estar dialogando demais.



É importante notar que, nesta época - março de 1978 - Lula afirma-se como um líder operário. Faz questão de dizer que é apolítico e que prefere "preparar a classe trabalhadora para saber optar ". A criação de um partido ainda não faz parte de seus planos.






- Quantos anos você tem? - Trinta e dois.

- E quantos de batalha? - Comecei no sindicato em 69, levado por meu irmão, um daqueles que foi preso em 75, na época do Vlado (Vladimir Herzog) quando era vice-presidente do sindicato de metalúrgicos de São Caetano. O nome dele é José Ferreira da Silva, mas o apelido é Frei Chico. E inclusive estava para ser condenado por ser esse o seu codinome. "Você Frei Chico, foi o partidão que te deu esse nome!". Pô, fomos nós lá no sindicato que pusemos esse apelido nele e foi preciso que os diretores do sindicato fizessem uma declaração confirmando isso.


- Onde você trabalhava nessa época? - Na Villares. Torneiro mecânico.
- Era bom de torno? - Me achava bom, sabe, tinha 14 anos de profissão. E continuo na Villares. Faz uns dois anos que entrei com um pedido de equiparação salarial porque quando entrei pra diretoria, em 72 (diretoria do sindicato), existia um salário teto que depois de certo tempo a gente atingia.  Um grande número de companheiros foi mandado embora, mas os que continuaram subiram de cargo, ganhando quase o dobro do que eu ganhava. Em novembro a empresa resolveu me pagar o equivalente ao que meus companheiros que entraram junto comigo e em 66 estavam ganhando e passei a ganhar Cr$ 12.000, 00 (1).

- Você se dá bem com os Villares? - Não tenho contato com eles. Só uma vez estive com Carlos Villares e dentre os empresários com quem temos conversado me pareceu uma pessoa acessível. Quero inclusive testar esses empresários. No primeiro contato que tive com a área empresarial - conversei com mais de 30 empresários - houve os que demonstraram maior aptidão para o sindicalismo livre, mas não chegamos a discutir a coisa em profundidade. Talvez a liberdade sindical que eles queiram não seja a mesma que eu quero.

- Você acha que é só da boca pra fora? - Não sei ... senti que eles tinham medo de conversar com a gente. Fazia muito tempo que a classe empresarial não descia do pedestal e conversava com o trabalhador. Não acredito que nenhum empresário vá fazer concessões pro trabalhador porque o Lula tem nariz comprido, né, só vão realmente ceder alguma coisa no dia em que a gente poder tomar uma posição mais séria em termos coletivos. A gente precisa caminhar pra isso o mais urgente possível.

- O que é liberdade sindical para você? - É impossível imaginar um sindicato como o nosso, criado por um governo pela necessidade de agrupar trabalhadores dentro de estruturas que lhe permitam manipular uma minoria que seriam os dirigentes sindicais. Sindicato como eu entendo, deve ser criado pela necessidade da classe trabalhadora. Os trabalhadores é que devem criar seu sindicato e serem os únicos responsáveis pela sua manutenção financeira.

- Acabando com o imposto sindical? - Sim, os trabalhadores devem se sentir responsáveis. Se precisarem pagar até 10 dias de trabalho, que paguem, mas pra ter um sindicato forte e atuante, o que só vai acontecer quando o trabalhador tiver garantia de emprego, sabe?  Hoje é muito difícil pra um trabalhador fazer alguma coisa pelo sindicato porque é mandado embora.

- O que seria " garantia de emprego"?  - Não é aquilo que tínhamos há alguns anos atrás, aquela estabilidade aos dez anos de serviço. Aquilo era meio utópico, porque o trabalhador dificilmente atingia esses dez anos.

- Era demitido como  nove?  - A estabilidade pra mim tem de ser a partir do primeiro dia em que o trabalhador entra no emprego: pra ser mandado embora tem de ter um motivo justo e sua dispensa tem de ser julgada por uma comissão paritária de empregado com o empregador.

- O sindicato italiano é assim.
- Mesmo em caso de dispensa tem de haver critérios. Hoje a empresa manda trabalhador embora quando quer e não tem de dar satisfação pra ninguém. O que a gente reivindica é que deve haver alguns critérios. Vamos pegar o caso Ford no ano passado, que queria reduzir os salários e aumentar a jornada de trabalho. Caberia à empresa saber quais os trabalhadores que queriam ser dispensados. Tem trabalhador que quer ser mandado embora e não mandam, outros não podem ser mandados embora firme por sua situação financeira, e a empresa dispensa. Que fosse feita uma pesquisa para saber quem queria ser mandado embora, que fosse adotado o critério de idade ou de responsabilidade familiar. É preciso criar como os critérios.

- Como é que anda o medo da classe operária ? - Existe muito medo. A gente vai ter que fazer verdadeiras campanhas de massificação da classe trabalhadora pra poder tirar essa cisma de perder o emprego.

- O medo básico é esse? - E não só entre os operários.
- Você não pode condenar o trabalhador por isso. A rotatividade da mão-de-obra – que temos denunciado mas pouca gente tem dado ouvidos - faz com que o trabalhador, depois de três anos de firma, ganhando Cr$ 30,00 por hora, arrume um outro emprego ganhando 15 ! Por isso o trabalhador quer segurar o emprego.

- Esse negócio de passar pro FGTS foi uma safanagem ,né, botou o cara rodando feito peru.  - Se essa lei veio com o objetivo de criar um banco, que esse banco seja administrado pela classe trabalhadora. O dinheiro é nosso, pô! veio o fundo de garantia pra acabar com a estabilidade, deixando os trabalhadores à mercê dos empregadores e taí financiando mansões, deixando de lado o trabalhador.

 
- E essa coisa de voltar a estabilidade junto como FGTS? - Entendo que o FGTS poderia até continuar, mas com uma ressalva, porque dá é um prejuízo pro trabalhador. Lá em São Bernardo já ganhamos um processo a esse respeito. Se você fizer o cálculo da lei velha e o cálculo do que ganha o trabalhador que é mandado embora, verá que hoje tá perdendo pelo menos 40%.

- Aqui no Rio uma juíza do trabalho já concedeu dois pareceres favoráveis à reposição dessa diferença.   -  As empresas utilizam o sistema de rodízio entre elas : demitem da Chysler pra passar pra Volksvagen com um salário menor, por exemplo. - 70% da nossa mão-de-obra é semiqualificada, operadores de máquina, trabalhadores que aprendem a fazer uma peça dentro de quinze dias, só apertando botões. Mas depois de certo tempo na empresa podem atingir um salário razoável, se comparado com o salário mínimo. Só que quando é mandado embora da Volksvagen ganhando C$ 20,00 por hora, vai entrar na Mercedes ganhando C$10,00.

- As empresas nunca sofrem prejuízo na produção porque a dispensa é recíproca. -Convém registrar que a memória nacional é curta: a safanagem do fim da estabilidade do foi feita por Roberto Campos. - Em 1963, no Congresso Nacional dos Metalúrgicos, os trabalhadores aprovaram a criação de um fundo mas para ser paralelo à estabilidade e não pra acabar com ela. Roberto Campos aproveitou a deixa e criou o FGTS.


- Dois ministros - Prieto e Nascimento Silva - discordam desse FGTS, achando que um seguro-desemprego é desnecessário. - Desnecessário porque não sofrem o problema do desemprego.


- Com toda a repressão em cima do sindicalismo no Brasil, como é que você conseguiu formar uma liderança sindical efetiva? - É simples. O problema é não ter o rabo preso. Não posso julgar os outros sindicatos porque não conheço, mas acho que o homem que não é corrupto, que não deve nada a ninguém, que não quer fazer do sindicato um emprego, pode falar à vontade. Até estranho quando os dirigentes sindicais de um tempo pra cá falam no medo. Supõem que essas coisas vão acontecer, então não fazem. Todo dirigente sindical teria de estar convicto daquilo que está fazendo e, se achar que a coisa é perigosa, que se afaste do sindicato e deixe um outro do companheiro vir.


- Há quantos anos você é presidente do sindicato? - Três.


- Como é que ocorreu sua ascenção? - Meu irmão era sócio ativíssimo no sindicato, trabalhava até mais que a diretoria. Em 69 foi convidado para ser diretor mas não quis, porque já tinha um delegado sindical na fábrica em que trabalhava que era amigo dele. Ficou faltando um nome pra compor a chapa e ele falou: "Vamos levar o Lula lá." Eu não queria ir e tal, o pessoal me convenceu. Mas fiquei muito decepcionado, a gente é novo na coisa, achei que se eu entrasse ía resolver os problemas dos trabalhadores. Eu ia chegar e trepar na mesa do chefe... Mas comecei a enfrentar as barreiras. O dirigente sindical sofre várias restrições, existe toda uma estrutura que protege as empresas, e dirigente sindical, mesmo tendo garantias, pode ser mandado embora se extravasar no direito de ser dirigente sindical. Em 72 eu não queria mais concorrer, mas o Paulo me convenceu outra vez. Fui ser primeiro-secretário e trabalhar no departamento jurídico, cuidando do INPS e aposentadoria. Aconteceu até um fato gozado: foi aí que conheci minha mulher.


- Ela é metalúrgica também? - Não, o irmão dela tinha ficado louco e ela ía no sindicato buscar atestado de dependência econômica. Trabalhava um tal de Luizinho comigo e falei pra ele: "Olha, toda viúva e 18 a 25 anos que aparecer e me chama que eu... " Já viúvo, né?


- Viúvo? - Casei em 69 e fiquei viúvo em 71. E essa é minha mulher de hoje também é viúva, ficou por três meses de casada.


- É uma continuação de "Dellito D'Amore". - Com eu tava numa reunião de diretoria, o Luizinho mandou ela voltar de tarde, só preu poder atender. Ele era amigo mesmos, né? Namorei com ela cinco meses e casei.


- Já tem filho? - Um do primeiro casamento dela, esse meu agora, e ela está grávida de cinco meses.


- Você não teve filhos do primeiro casamento? - Morreu no parto, a mulher e filho. Quando faltava um ano pra eu terminar a gestão, a fábrica do Paulo, o presidente, mudou pra outra cidade, então ele não podia concorrer. Poder poderia, existem inúmeros dirigentes sindicais não têm nem fábrica e põe em registro frio na carteira (1).


- Como é isso? - Não tem emprego. Conheço alguns, por exemplo, que suas empresas faliram, logo não poderiam concorrer.


- A lei exige que haja vínculo empregatício. - Aí acertam com a empresa: "Redige minha carteira que não vou te encher o saco" (1), e continua com o dirigente sindical.


- Isso é que pelego? - Não, pelego é pior. 
- Numa reunião discutimos que seria contra nossos princípios ter um dirigente sindical com registro frio, embora existam centenas de empresas que topam. Bom, o presidente era pra ser o que hoje é meu vice-presidente, em São Bernardo. Fiquei meio apavorado porque o sindicato é muito grande, uma máquina.

 - Quantos associados têm ?
- Trinta e oito mil.


- É o maior sindicato do Brasil? - Não, tem outros.


- A diferença é que o sindicato dele representa 120.000 trabalhadores. - Só tem 1/4 associado? - Nosso sindicato é novo, tem 18 anos, pô. O número de matrículas já é de 102.000, quer dizer, 102.000 já ficaram sócios do sindicato, mas a rotatividade faz com que os caras saim da categoria. Tive um pouco de sorte na presidência, sabe, tô colhendo aquilo que meus antecessores plantaram.


 - Você já tinha um certo temperamento de liderança? - Não....


- Seu pai era operário ou camponês? - Camponês, trabalhava na roça lá em Pernambuco. Depois largou a minha mãe e o veio pra Santos carregar saco de café do IBC. Aposentou aqui.


- Quantos irmãos você tinha? - Éramos oito. Meu pai veio na frente, acho que no ano em que nasci. Mandava dinheiro pra minha mãe, e tal, a gente não sabia que tinha outra mulher. Aliás, a outra mulher que tinha aqui era prima da minha mãe. Um dia foi lá e trouxe meu irmão mais velho. Esse meu irmão chegou aqui e não contou nada, mas escreveu pra minha mãe como se fosse meu pai, convidando ela pra vir pra São Paulo. Pegamos um pau-de-arara lá, treze dias de viagem, pô, lembro bastante disso. Coloquei uma camiseta lá e vim tirar aqui, depois de treze dias. O fedamãe estourou, tava podre. Vocês nunca viajaram num pau-de-arara, né? É um caminhão como uns banquinhos, nêgo sentado ali, criança faz as necessidades dela, a gente dormia ali, dormia na rua, nas calçadas, às vezes acordava com uma fdp duma chuva em cima da gente, ía comendo farinha com rapadura e queijo...


- Os paus-de-arara que existem por aqui também são terríveis. - Quantos anos você tinha? - Sete. Aí chegamos em São Paulo, fomos pra Santos, e encontramos meu pai com outra mulher e mais cinco filhos dessa outra.


- Bicho danado, heim. - Um compadre dele ofereceu uma casa pra minha mãe ficar, depois meu pai colocou uma mulher numa casa e outra em outra, e visitava as duas casas. Dava cobertura: três dias numa, três dias noutra...


- E sobreviveu? - É, taí... Meus irmãos arrumaram emprego, eu vendia laranja, tapioca... apanhava muito desse irmão frei Chico, porque ele gritava alto: "Ô tapioca", mas eu tinha vergonha de gritar, aí ele metia a mão em mim! Em 56 uns irmãos meus vieram embora pra SP, arrumaram emprego, e buscaram minha mãe. Ficamos eu e Frei Chico morando com meu pai até as coisas melhorarem. Depois de uns três ou quatro meses minha mãe nos buscou pra morar em São Paulo: dez num quarto e cozinha. Tinha também um primo que foi morar conosco. Era o fundo de um bar; o que dava de bêbado passando ali para ir ao banheiro..


 - As pessoas ficam perguntando a formação política do Llula, etc. e tal. É isso aí. - E os estudos? - Só tenho o primário. Fiz ginásio através do madureza mas não considero feito, sabe. Se puder voltar a estudar - agora só quando sair do sindicato - quero fazer um ginásio melhor, onde realmente aprenda e tenha uma base.


- Você costuma ler? - Leio bastante jornal. Não tenho tempo de ler outras coisas. Pra ter uma idéia: Dr. Almir, nosso advogado, tinha me arrumado uns livros sobre a república velha. Cheguei em casa, fui ler, a molecada não deixou. Aí peguei e me tranquei no quarto. A molecada começo bater, xinguei a molecada, a mulher quase me bate. "Pô, você fica o dia inteiro fora de casa, quando chega ainda quer se trancar? O livro não é teu filho, teu filho é esse monte que taí!" Aí pronto, acabou leitura.


- Mas você se expressa bem e tem facilidade de pensamento. Onde adquiriu isso? - É a escola da vida, né?  Converso - e sou um dos diretores que menos conversam - com trinta ou 40 trabalhadores por dia . Converso também com engenheiros, advogados, médicos... 


- E ultimamente com jornalistas. - Ih, vai desaprender tudo. - A partir de determinado momento o sindicato passou a agir num nível sindicato-empresário, mas não estava tendo a mínima repercussão. Estava entrando pelo cano mesmo. Mas aí vocês pensaram: "Vamos ver se imprensa dá uma força pra gente ', e realmente foi isso que aconteceu.   - Muita gente me pergunta: "Porque vocês só começaram a falar agora?" Pô, não foi só agora, estamos falando há muito tempo. Agora é que a imprensa descobriu que o trabalhador e existe. Não digo os jornalistas, esses não têm culpa, digo os donos das empresas que não permitem que se fale do trabalhador, porque são empresários. Se a grande imprensa resolver parar de falar no trabalhador, este deixa falar outra vez. Por isso faço as coisas sem me preocupar com imprensa ou se vai haver cobertura ou não. É lógico que com uma cobertura você pode atingir o um público muito maior, mas não posso contar com isso. Amanhã se o dono de um Estadão, duma Folha ou dum Jornal do Brasil pode resolver falar:" trabalhador não entra mais aqui porque a partir do momento que eles ganharem alguma coisa os jornalistas também vão querer ganhar"... sei que vão agir assim. *** - O sindicalismo no Brasil é todo fragmentado e cada sindicato é uma coisa. Está uma zona que não se entende nada. O que você acha da criação de uma confederação nacional? - Sou favorável inclusive ao pluralismo sindical; se a estrutura fosse outra poderíamos até ter sindicatos por empresas.


- Como nos EUA? - Como no México ou na Alemanha. Agora, tem que ter um órgão central pra coordenar a coisa . Você conheceu o sindicato ontem. Iimagine se tivéssemos 16 sindicatos naquele prédio, pois representamos 16 categorias econômicas. Imagine isso sabendo que cada sindicato tem 24 diretores. Só diretor a gente teria mais de 300 pessoas trocando idéias sobre os problemas dos trabalhadores.

- Pelo que vi lá, o grande problema de vocês e a falta de gente sindical nas fábricas.
- A estrutura sindical permite apenas 24 diretores, não importa o tamanho da categoria. Um sindicato que representa 2000 trabalhadores tem o mesmo número de diretores que o de São Bernardo, que representa 120.000. Tenho 623 empresas na minha base. Só tenho diretor em 12. Ficam 611 descobertas, sem nenhum dirigente sindical, porque a lei não permite mais.

- Não tem nem representante? - Não, a empresa bota na rua. - Criamos um Conselho de Coordenação de Trabalho de Base, desligando dois diretores da produção, pra dar cobertura nessas empresas. Severino - com quem você conversou - trabalhou numa das poucas empresas onde existe mentalidade sindical. Pegou a Scania com 162 sócios e conseguiu elevar esse número pra 1100 e pouco, e é respeitado por todos os trabalhadores da empresa.

- Na Mercedes-Benz isso existe também. - Qual é que mais sacaneia? - Olha, é difícil saber qual que menos sacaneia. Se existe subversão no Brasil, muito dela é feita pela classe empresarial.

- Lula, quais têm sido suas dificuldades com o órgão de repressão? Quantos agentes tão te seguindo? - Se eu disser que sofri repressão, estou mentindo, sabe. Nunca me prenderam.

- Nem chamaram para depor? - Chamaram quando uma empresa me denunciou como subversivo. Fui com o diretor do Dops e fui muito bem tratado. Isso foi o ano passado. Agora fui na polícia federal por causa do Congresso das Mulheres, mas também foi muito bem tratado.

- O que vocês achou dessa reunião das mulheres metalúrgicas? - Pude provar que podemos esquecer esse negócio de mulher e homem pra falar em termos conjuntos de trabalhador. A gente tem a mulher como gente do sexo fraco, esse negócio todo, mas esse Congresso me ensinou que a mulher, bem preparada, é muito mais homem que os homens, inclusive empurra a homarada para tomar posição.

 - Depois do Congresso das Mulheres várias fábricas do ABC tão mandando a congressistas pra rua. Tem inclusive o caso gritante de uma menina que tinha 9 anos e meio de casa e, a partir do congresso, essa empresa começou a implicar, implicar, até arrumar uma forma de jogar ela na rua por justa causa para. A arteb já mandou umas dez mulheres embora, todas elas participantes do congresso. - Vamos ter que tomar uma posição com relação a isso. Essa empresa nunca irá admitir que foi por causa do Congresso. Na última assembléia que tivemos expus que, se nós trabalhadores não tomarmos a posição quando um companheiro da gente é prejudicado, amanhã seremos nós e todo mundo vai ficar com medo e calado. Quando vim pra cá deixei a diretoria reunida para resolver o problema dessas mulheres. Vou convocar uma assembléia dos trabalhadores e se eles estiverem preparados, e se toparem, a gente chega até a parar para a readmissão das meninas.

- Parar, que você está dizendo, é greve. - Primeiro a gente sempre procura resolver as coisas amigavelmente. Temos condições de resolver uma porção de coisas assim. Agora, esses trabalhadores quiserem tomar uma posição em defesa das dez... o que posso fazer é dar orientação, dizer que deve ser feito, mas não posso parar, não adianta eu ficar parado e eles trabalhando que a fábrica vai continuar do mesmo jeito. A tendência é tomar uma posição muito séria: o readmissão dessas meninas ou pelo menos pagariem a indenização dessa Maria Helena.

- Não há nenhuma lei que garanta a proteção dos sindicalizados? - Nada.
- Só para os 24 diretores. - É a dificuldade de surgir oposição no sindicato. Para não perder o emprego a oposição é obrigada a ficar quieta durante um determinado tempo, tem que trabalhar de mão presa, porque se começar a aparecer é mandado embora.
- Estive conversando com uma menina que não foi mandada embora, mas como foi ao sindicato, e está a favor da menina que foi mandado embora, já está esperando sua demissão. - Não é preciso ir muito longe pra encontrar outro exemplo: o liberal brasileiro que é o Júlio de Mesquita Neto. Dois jornalistas da sucursal do Rio estavam iniciando uma campanha pra indicar uma chapa. 24 horas depois um deles foi simplesmente mandado embora, sem mais nem menos. - Um pouco antes da formação da chapa tínhamos feito uma reunião com 96 ferramenteiros da Volkswagen. Teve um menino da chapa que me impressionou muito pelo jeito de falar e de mostrar as coisas. Mas é por isso que não gosto de formar comissões: você expõe um grupo de trabalhadores ao empregador. Se fizer uma comissão de 10, daqui a cinco meses não tem mais nenhum com emprego na fábrica. Também não adianta fazer comissão clandestina. Esse menino fez parte de uma comissão e só não foi mandado embora porque registrei a chapa um dia antes. A ficha dele já tinha sido mandada para o departamento de pessoal para ser mandado embora.

- Manifestou-se aqui a preocupação pela existência de uma lei que pudesse proteger aqueles que se interessam pelo sindicato mas não fazem parte de uma diretoria. O sindicato de trabalhadores no Comércio de Petróleo aqui iniciou uma tentativa perante a justiça do trabalho, pedindo a estabilidade do delegado sindical (consta na consolidação que o sindicato tem direito de nomear um delegado em cada empresa ). Se a gente conseguisse isso seria uma coisa boa. - Como pretendem colocar na cabeça desse pessoal que é preciso não ter medo ? - O movimento sindical trabalha muito em cima do que acontece e a gente tem que dar sustentação a determinadas teses. Por exemplo: o contrato coletivo de trabalho, comprovado no mundo inteiro como a melhor forma de relacionamento entre capital e trabalho, com os trabalhadores tratando coletivamente das suas condições de trabalho. Aqui no Brasil, desgraçamente, o que está em vigência é o contrato indivídual, quer dizer, um trabalhador humilde que veio da roça tratando das suas condições de trabalho com uma multinacional. Então existem aqueles contratos leoninos, em que o empregador exige e o trabalhador aceita. Nós entendemos que o contrato coletivo de trabalho é válido, mas temos que fazer um trabalho diário de massificação, jogar contra o coletivo na cabeça do trabalhador todo santo dia, para ele acostumar com isso e aprender o que é. Pra ele saber o que é bom.

- Senti o que é esse trabalho de massificação quando andei pelas portas de fábricas perguntando quem era o Lula, o que achavam dele e o que achavam do sindicato. Me espantei porque a maioria realmente desconhece o que é movimento sindical, o que é sindicato e quem é o Lula.   - Existem muitos trabalhadores que não sabem nem o que é "sindicato". Se hoje não sabem, imagine há um ano atrás quando ninguém falava nisso. Um dia cheguei para um companheiro da Villares e falei: "companheiro, o negócio é o seguinte: você vai ou não vai ficar sócio do sindicato?" (1) Ele falou: "O que é sindicati?" Existe um grande número de trabalhadores assim. Lá em São Bernardo mesmo existem milhares de trabalhadores que não conhecem o Lula. Isso pode ser explicado. Vocês já entraram numa fábrica automóveis? O trabalhador não tem tempo de nada, de ler, de pensar, só tem tempo de trabalhar.

 - Você falou que existem fábricas que só dão 10 minutos pros caras fazerem as necessidades fisiológicas. - Digo mais ainda. Tem trabalhador que urina apura numa lata por que não tem tempo de sair da linha de produção. como é que um homem desses vai conhecer Lula e o sindicato?   (com o endeusamento do sindicalista feito pelos jornais e TV)

 - E aí, como é que vocês ficam? - Quando penso em movimento do trabalhador nunca penso neles como um todo, porque é impossível. Penso numa maioria organizada, um grupo de sustentação, preparando pelo menos um em cada setor da empresa. Mesmo que não se exponha, quando chegar o momento exato esse trabalhador poderá ser o porta-voz do sindicato dentro da sua seção (1).

- Uma prova de que um trabalhador consciente, sindicalizado, protegido e reivindicador de seus direitos não prejudica a produção - pelo contrário, até a melhora - está em que o maior sindicato de trabalhadores fora dos EUA é o da Fiat na Itália. Quando estive em Milão o pessoal do sindicato estava me explicando como é que se reúnem com o alfa AGNELLI (presidente da Fiat): a mesa tem duas cabeceiras, o AGNELLI numa e o presidente do sindicato noutra. O AGNELLI também chama o a outro cara de excelência. O trabalhador italiano conseguiu uma proteção incrível e deu certo, pois com toda a pressão dos fabricantes americanos e alemães, a Fiat é uma das fábricas de automóveis de maior expansão. Não deveria ser feito um trabalho não só para conscientizar o trabalhador brasileiro, mas também o empresário brasileiro? - Costumamos falar que o trabalhador não é politizado ou conscientizado... qual a classe brasileira que é consciente? Só a classe empresarial, que tem consciência de que é preciso ter lucro explorando a classe trabalhadora. O que falta para os empregadores entenderem os problemas dos trabalhadores é as suas fábricas pararem. Quando a fábrica dele parar vai ter consciência de uma porção de outras coisas, sabe.

- Mas vocês não podem parar as fábricas. - Não podemos em termos. Vamos dar mais um tempo, que vamos ver se podemos ou não podemos. Não vejo outra forma, pô. Conversar com o patrão? Já conversamos. Conversar com autoridade? Já conversamos. Ninguém está preocupado com o trabalhador. Nego está preocupado que trabalhador tem de se responsável pela paz social, sabe, tem que produzir bastante para grandeza da nação ... tivemos até que dar ouro pro bem do Brasil, pô, e cadê a volta pra a gente? Nada ? Então vamos dar um tempo aí, está chegando o momento, eu sinto.

 - Lamentavelmente temos que ir. Vamos entrevistar o presidente Geisel. - Algum recado pra ele? (dois entrevistadores saem) - Acha que um trabalhador vai se preocupar em ir à assembléia de sindicato e perder o ônibus da empresa que vai colocar ele na Lapa? Se for pro sindicato foi ter que pegar um ônibus as 10h da noite.

- Isso mais empresas grandes. - Mais 80% da nossa categoria trabalha em empresas grandes.

 - Na Itália existe uma recomendação expressa na lei trabalhista para que nas contratações coletivos estabeleçam-se cláusulas dispondo sobre a participação dos trabalhadores no lucro e o empresário tem é a força de trabalho do operário. - Quando o operário senta lá na mesa o Agnelli não fica chamando o cara de doutor só porque ele é bonito, mas porque sabe que atrás de sua palavra tem todo esse pessoal. É isso que temos de conseguir aqui no Brasil.

- A coisa mais importante que o empresário tem é a força de trabalho do operário. - Você percebe essa transformação nas outras categorias profissionais? - Sim. Vou contar sobre uns sindicatos mas vai ser em off. Essa aprendi com jornalista. (Dá o serviço e depois manda ligar o gravador de novo.). Não contei isso porque vejo que em São Paulo formei muitos inimigos. A maioria dos dirigentes sindicais são velhos e estavam acomodados, mas agora vários sindicatos estão exigindo que seus dirigentes tomem uma posição. Pra esses caras passei a ser efedepê porque estou fazendo eles trabalharem.

- O que se mudou na legislação trabalhista e previdenciária não foi algo normal, mas pouca gente comentou. Estão mudando tudo e preparando uma coisa pra cair de sopetão em cima dos trabalhadores. - A legislação trabalhista é feita nas coxas, sabe, sem ouvir a classe trabalhadora que é a maior interessada. Ouve-se a classe empresarial mas não a trabalhadora. Vamos pegar a lei de férias. Nos reivindicávamos férias em dobro e o que fizeram foi oficializar a venda das férias. Pega agora esse projeto de lei das mulheres que não mudou em quase nada, muito pelo contrário. As mulheres em São Bernardo perderam porque tinham 60 dias a mais de estabilidade do que essa lei agora vai dar. As coisas são feitas sem ouvir a quem de direito, feitas por homens que ganham altos salários, instalados em gabinetes com ar-condicionado... poucos desses homens conhecem o que seja o trabalhador e como funciona o seu trabalho na fábrica. As reformas vêm assim de supetão, sem beneficiar ninguém a não ser empresários e autoridades.

- Como você prevê um trabalho sindical importante quando toda essa legislação está cerceando cada vez mais o operário? - Aí é que está o xis. (NÃO SOUBE RESPONDER)
 - O Lula disse que essa legislação é feita sem consultas. Acredito até que elas existam, só que feitas por uma liderança já ultrapassada, encastelada na confederações, sem o menor interesse pelo trabalhador. A grande responsabilidade está nas cúpulas. Lula, como presidente de sindicato, está nas bases. - Temos a Federação, que é estadual, e a Confederação, que é nacional, cujo presidente é o Ary Campista, mas faz 40 anos que o homem não sabe o que um trabalhador. (CONSTANTES CRÍTICAS A OUTROS SINDICALISTAS)
- Por que você e o Ronaldo não tomam essa Confederação? - Eu e o Ronaldo inclusive somos de Federações diferentes.

- Então faz uma Federação para todo Brasil! - Quando a gente fala em confederação geral dos trabalhadores, muitos confundem isso com o movimento sindical de 64, que poderia ter conseguido muita coisa mas não fez talvez porque os interesses maiores não fossem os da classe trabalhadora. Mas a partir do momento que o trabalhador resolver tomar uma posição - não sou otimista, a coisa está mesmo pra acontecer - vamos exigir inclusive a mudança de leis. Se houvesse contratação coletiva de trabalho, esse caderno de leis que temos, que é dessa grossura - os advogados precisam até para de guindaste apara carregá-lo - seria reduzido a um bloquinho. (MAIS COMPARAÇÔES E CRÍTICAS AOS OUTROS).

 - O resto é casuísmo . - É a sustentação do judiciário trabalhista brasileiro.

- Você acha que vão conseguir isso ? - Para mim o contrato coletivo é irreversível .

- Quais são os dados concretos que você tem nesse sentido? - Tenho um dado quando vejo o Ronaldo assumir um sindicato aqui com uma idéia danada de briga. Vejo o João Paulo em Monlevade, o Dutra nos Bancários do Rio Grande do Sul, os trabalhadores de outros Estados também começando a entender que a coisa tem de mudar.

- O governo vai permitir que vocês cresçam? - Veja só, não podemos ficar sempre esperando a permissão. Há um momento em que a gente tem de exigir. A gente está muito acostumado a pedir, pô, tem dirigente sindical que não faz outra coisa a não ser comprar o Diário Oficial pra ver se saiu algum decreto beneficiando eles. Isso precisa acabar! Precisamos deixar de receber concessão e começar a exigir nossa participação!  

- Você tem recebido muitas críticas por estar dialogando demais. De repente chega o Delfim - logo quem! - dizendo que você é a coisa maravilhosa que aconteceu nos últimos tempos. Depois recebeu apoio do Dilermando. - Bate um papo com Portella... - Como se explica a sua força com a burguesia? - Eu estaria incoerente comigo mesmo se - entendendo do que soluções da classe trabalhadora estão no contrato coletivo de trabalho e no pleno exercício do direito de greve - deixasse de expor isso aos homens como Portella. Os dirigentes sindicais sempre tiveram medo de falar, mas você só começa a fazer as coisas quando forma uma opinião pública e todo mundo fica sabendo o que é aquilo. Estou preparado para sentar numa mesa com um patrão como gente, sem dizer "esse é meu inimigo". Não faço isso não. Converso com o patrão defendendo o trabalhador e ele defendendo o capital dele, mas sem partir pra porralouquice ou agressão moral. O patrão é um inimigo a partir de omissão na gente, é muito cômodo o agente se omitir e falar que os patrões não querem dar, quando a gente não exigiu, pô. Até quando o filho da gente pede uma coisa e a gente não dá, se ele não chorar tudo bem, mas se ficar na porta do bar chorando, ou você dá ou...


 - O moleque entra em greve. - Esses patrões que estão falando bem de mim, esse negócio todo, vamos ver se vão falar isso quando a gente puder reivindicar e tiver que exigir alguma coisa deles.


 - Ao lucro do patrão corresponde a miséria do trabalhador. - Quando o patrão está tendo muito lucro, é sinal de que alguém está tendo pouco . É preciso dividir issoNão sou eu que tenho essa consciência, é o mundo desenvolvido que mostra isso. Hoje, no Brasil, uma minoria ganha tudo e a maioria não ganha nada. Essa maioria precisa ganhar um pouco, diminuir um pouco da minoria.  


 - Mas em todos os países de grande produtividade operário é protegido. - Mas esse negócio de produtividade é balela, existe quando determinados setores da indústria têm uma demanda e depois começa a cessar. Esse negócio de "elevar a produtividade” é uma maneira de fazer o trabalhador trabalhar mais. - Acho que a questão não seria de produtividade, mas de participação nos lucros da empresa (O POVO DEVERIA PARTICIPAR DO LUCRO DA UNIÃO, NÃO DAS EMPRESAS QUE DÃO QUASE METADE DO QUE ARRECADAM PARA A POLITICALHA DESVIAR, INCLUSIVE O LUÍS INÁCIO-o lula). A partir de determinado valor, o lucro deveria ser distribuído para os trabalhadores da empresa. Qual o país que ficou e economicamente forte sem a criação de um mercado interno? A partir daí, o que sobrar pode ser mandado para fora. Mas nós não temos mercado interno e já queremos montar um mercado externo !


- O trabalhador sendo protegido tem mais dinheiro; tendo mais dinheiro, compra mais. Aqui não dá para ele comprar nada. - E o general Figueiredo, em entrevista a o Globo, disse que esse negócio de mercado interno é utopia, que o Brasil precisa de é de dólar, por que o cruzeiro não vale nada. - É uma visão que, se for verdadeira, contraria toda a minha maneira de ver, sabe. Mercado interno é uma realidade. Pega Japão, França, Alemanha, Itália, todos esses países aí: primeiro se criou o mercado interno. O Brasil precisa de dólares pra que? Pra meia dúzia de caras? O Brasil está precisando é que o povo tenha dinheiro para comprar aquilo que produz. Se o trabalhador fabrica geladeira, tem para o ter geladeira. Se fabrica televisão, tem de ter televisão. Se fabrica carro, tem que ter carro. O mínimo que deve ter é que o que produz. (ISTO SERVIRIA TAMBÉM PARA A PRODUÇÃO DE ÔNIBUS, AVIÕES OU IATES?).

 - Aí você não está querendo uma sociedade de consumo?
- É impossível haver uma sociedade de consumo num país com 50% de famintos. - As coisas aqui andam meio erradas. A partir do momento em que o mundo precisa de alimento - coisa que aqui no Brasil dá até em pedra - porque não se faz uma campanha de exportação de alimentos, ao invés de essa campanha de exportação de automóveis?


- Isso faz parte do programa do general Figueiredo: a internou a internacionalização da agricultura. - Com Ludwig não quero exportação! - É, também não pode faltar alimentos pro brasileiro.


- Vamos mudar de assuntos para falar de algo que paira sobre essa discussão de sindicatos: o pelego, lula, define o que é pelego. - Pelego vocês sabem o que é, né não?


 - O couro que fica entre a cela e o cavalo. - Foi assim que surgiu essa expressão. Não me sinto em condições de julgar ninguém, cada um é aquilo que acha que deve ser, mas o dirigente sindical que se preza não pode em nenhum momento pelo sindicato como um o órgão empregatício e de um status. O dirigente sindical que se preza não pode deixar de denunciar as arbitrariedades existentes dentro de sua categoria. O pelego é omissão do movimento sindical brasileiro. É de muita recepção, mas de pouca participação . Um dirigente sindical que se preza não deveria se subordinar a ser o vogal, um juiz classista, apenas para ganhar dinheiro. Imagine você um trabalhador que, como eu, ganhe 12.000 cruzeiros por mês e  passea ganhar 13.000 cruzeiros como vogal, indo pra Cr$ 25.000,00. Se não tiver princípios, vai querer largar isso pra voltar a ganhar Cr$12.000,00. Isso é que define o pelego.


 - O pelego serve mais ao operário ou ao patrão? - Muito mais do patrão. É um entrave no desenvolvimento da classe trabalhadora.


- Dá muito pelego no sindicalismo brasileiro? - Dá numa proporção de 70 a 80%. Conheço um sindicato que nunca faz o uma assembléia ! Chega na época do dissídio coletivo, pega o advogado, faz a petição e entrega na federação, sem nunca ter feito um o assembléia.


- Como é o apelido desse sindicato? - Sindicato do Carimbo. O presidente é chamado de João ladrão. Na parte da manhã trabalha no supermercado do qual o ele o dono. À tarde vai para a justiça do trabalho onde é vogal. Aparece no sindicato das seis às sete da noite.


 - Vai lá, carimba tudo e vai embora. - O movimento sindical que desembocou em 64 era dirigido por pelegos? - Tanto isso é verdade que os homens estão aí, toda a cúpula sindical é composta por homens de antes de 64. Isso também define o pelego: o cara consegue se moldar a qualquer tipo de governo. Se amanhã entrar um governo de ultra esquerda, serão 13 esquerdistas, se entrar um de ultra-direita, serão ultra-esquerdistas. Não vivi muito bem época de João Goulart, mas acho que ele ouvia muito dirigente sindical de gabinete, sem base popular.


 - Esses pelegos se refugiaram hoje nas cúpulas sindicais? - Nem todos, porque não deu para todo mundo. Pra terem uma idéia da coisa: não vou mais à reunião da Federação porque estou totalmente marginalizado. Quando abro a boca é pau pra todo lado em cima de mim. Os sindicatos são criados de acordo com as necessidades da Federação que, ao perceber que pode haver oposição, cria um sindicato novo, quer dizer, mais um voto pra ela. Cria sindicato, dá um gabinete odontológico, um gabinete médico, compra uma casinha pra ser a sede e põe o presidente pra morar lá. O balançar de cabeça de um presidente de Federação reprova ou aprova tudo que quiser.


- A função de um sindicato também é dar consultórios dentários e colônias de férias? - Pode-se até dar isso como complementação, mas nunca como prioridade.


 - Qual o percentual dos seus associados que utiliza o serviço social do sindicato? Até onde você conta com isso para mobilizar a massa? - Está havendo um erro por conta dos dirigentes sindicais que pretendo corrigir no próximo mandato. Pô, está certo que o trabalhador vá lá pra gozar de uma assistência médica e odontológica, mas cabe aos dirigentes sindicais aproveitar esse momento que ele está dentro do sindicato e levar uma mensagem pra ele. Ninguém faz isso. Tem que aproveitar a mulher e o filho do cara lá dentro pra levar uma mensagem sindical. Em São Bernardo vamos começar a fazer isso dentro de sala de aula. Nossos alunos do supletivo vão aprender o que é sindicalismo, e nas provas vão cair perguntas sobre isso. Uma vez fizemos uma convocação dizendo que os trabalhadores que não comparecessem à assembléia perderam o direito à assistência médica. Foi a maior assembléia realizada: ll000 pessoas! Mas sou contra isso, porque fizemos o cara ir na marra. Não podemos obrigar, cada um tem que seguir sua consciência.



 - Você não acha que a grande assistência do sindicato poder ser o advogado? - Porque a ASSSTÊNCIA MÉDICA NÃO É FUNÇÃO DO SINDICATO. O trabalhador já não paga INPS? - O coração do sindicato realmente é o Departamento Jurídico. O sindicato se perde a partir do momento em que pretende cobrir uma deficiência do Estado e do INPS, e assim a responsabilidade de começar a a dar assistência. O movimento sindical deve brigar pra que o Estado e o INPS dêem assistência médica para os trabalhadores sem jogar a responsabilidade pra cima de outros.


 - A Justiça do Trabalho não é um verdadeiro absurdo pra cima do trabalhador?- O excesso de advogados que tem no Brasil é o entrave pro contrato coletivo de trabalho . Com a contratação coletiva, a maioria desses picaretas deixariam de existir, porque não haveria mais queixas individuais. Em São Bernardo temos apenas uma junta de Conciliação; e, enquanto o limite máximo de processos a serem julgados por ano deveria ser de l500, entram 12000 por ano. Então há interesse do poder econômico de que não haja uma segunda Junta em São Bernardo.


- Poder econômico quer dizer empresas.  - O trabalhador vai no sindicato abrir processo e pergunta quanto tempo vi demorar. Aí quando sabe que vai demorar três ou quatro anos não abre mais.


- Só a primeira audiência demora seis ou oito meses. - Os vogais representam mesmo os trabalhadores? - Não, em nenhuma instância. Não quero generalizar porque existem alguns bons, mas vogal e juiz classista são verdadeiras vacas de presépio. A gente percebe que o vogais de trabalhadores simplesmente acatam o que o juiz determinar. Pedimos uma explicação do TRT sobre quais os critérios adotados pra escolher um vogal, porque teríamos interesse em eleger um. Até hoje esse juiz não nos respondeu e, conseqüentemente, São Bernardo é um dos poucos sindicatos dessa terra que não concorre ao vocalato. Olha, sou favorável à representação classista desde que gratuita. E que o dirigente sindical – que já recebe do sindicato – preste um serviço à categoria sendo vogal sem receber nada.


- O dirigente sindical recebe do sindicato ou da empresa?  - Lá em São Bernardo recebemos do sindicato; em outros lugares recebe-se da empresa. Eu acho que deve ser do sindicato mesmo, fica mais independente. (MAS MANTÊM O VÍNCULO - CARTEIRA ASSINADA - COM A EMPRESA VILLARES).


- Como foi o seu diálogo com o Petrônio? - Era a primeira vez que conversava com um homem-chave do governo e pelo menos ali na minha frente o Petrônio me pareceu ser sincero. Foi logo dizendo que não ia resolver pô nenhuma e...


- Então por que ele está conversando, ora? - Estava colhendo subsídios para depois mostrar a quem quisesse ver. Disse que não poderia soltar um monte de coisas porque a imprensa estava em cima. Fui conversar com ele com o objetivo de levar um documento e acho que atingi esse objetivo.


- Foi ele que te chamou? - Olha, em dezembro recebi um telefonema do Cláudio Lembo dizendo que em janeiro o Petrônio viria a São Paulo e que queria visitar o Sindicato de São Bernardo. Aliás, um dia antes o sindicato tinha recebido a visita do Brossard, que saiu pê da vida comigo porque pensava que eu ia pegar ele no colo só porque era do MDB. “Olha, Cláudio Lembo, as portas do sindicato estão abertas e se ele quiser entrar basta vir aqui.” Mas aí ele não pôde vir e acabou aquele negócio dele do diálogo. Outro dia recebi outro telefonema pedindo que eu fosse a Brasília conversar com ele e respondi que ia, pô. E fui. Disse o que disse aqui pra vocês, que o trabalhador está em situação disgramada, e não adianta apertar porque quanto mais sufocar mais vai se libertar. Não sou adepto da teoria “quanto pior melhor”, mas acho que não adianta esmagar porque, quer queira ou não, ela vai emergir. Só peço a Deus que eu possa participar disso.


- E o que disse o Portela? - “A partir de hoje passarei a defender algumas das teses que você me trouxe nos meus discursos no Congresso Nacional. E toda vez que for chamado a levar idéias pra mudanças de qualquer ordem, o que você me trouxe será colocado na mesa.”



Mas na plataforma do general Figueiredo não há uma palavra sobre o trabalhador. - Eu sei. No Brasil ninguém fala no trabalhador.


 - Magalhães tem um capítulo inteiro sobre a liberdade do sindicato. - O que você acha da tese de que o operário, para fazer política, deve se filiar a partidos? - Não só o operário mas o povo como um todo deve fazer política, até na mesa de um bar tomando uma pinga. Realmente, não aceito que os políticos exerçam influência dentro do sindicato, mas acho que o sindicato tem obrigação de exercer influência na classe política.


 - Sua posição é a de não se filiar nem à Arena nem ao MDB, mas você já foi sondado para a formação de um novo partido brasileiro? - Não. Lá em São Paulo existe um movimento para a criação de um partido social-trabalhista. Participei de uma reunião dessas, onde havia mais de cem dirigentes sindicais mas só um ou dois de expressão, o resto era... Pra ver o nível: quando cheguei lá, uma porrada deles veio me conhecer pessoalmente e me apertar, pra ver se era de carne e osso. (FÁCIL COMPREENDER COMO UM ALUCINADO COMO ESSE, DESDE "CRIANCINHA", ENDOIDOU APÓS CHEGAR À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA!)


 - Não pediram a guimba do cigarro? - Fala-se na criação de um PTB e os dirigentes sindicais se escudavam num Secretário de Estado de São Paulo.


- Era o Maluly Neto? - Era. Eu não quis fazer uso da palavra, primeiro queria me situar, saber onde estava pisando, tinha sido convidado... mas insistiram preu (sic) falar e aí fui muito agressivo com os dirigentes sindicais. Eles levantavam e perguntavam assim: “Se a gente sofrer alguma repressão a quem vamos recorrer?” Aí o Maluly? (bate no próprio peito). Os dirigentes sindicais pulavam que nem macaquinho. (AINDA ESTAVA SAINDO DO OSTRACISMO MAS JÁ USAVA O DEBOCHE PARA RDICULARIZAR OS OUTROS, COMO FAZ ATÉ HOJE). Depois disso não tinha jeito, eu tinha que falar, fui obrigado a dizer que mais uma vez os dirigentes sindicais me envergonhavam. O que deveriam ter como escudo era a classe trabalhadora e a consciência de cada um. Não precisavam procurar uma autoridade. Fui descendo o pau nos caras e todo mundo me aplaudiu. Só que resolveram que não devia mais participar de nenhuma reunião.


 - Você me perdoa, mas acho que você não pode ter isenção política, pois é óbvio que com dirigente sindical você tem uma posição definida. Ou você se acha como o cronista esportivo que diz: “Não, sou isento e não tenho nada Flamengo ou Fluminense?” Ou com o jurado de desfile que diz que não torce pra nenhuma escola de samba? - Não. Tanto é verdade que isso não é verdade, que em época de eleições a gente tem se definido, não por partidos, mas pelo homem. Eu digo que sou apolítico..... tenho que continuar falando que sou apolítico. Pra me filiar a um partido ele teria que afinar comigo


- Seria o PTB? - Não conheço a sua ideologia, pô.

- A tese do Magalhães é de partido não classistas. Ao invés de partido trabalhista, proletário, etc., seriam partidos de acordo com ideologias. - Mas aí os patrões dominam. - A solução dos problemas do trabalhador não está nos partidos políticos, mas na classe. Já tivemos aqui dez, doze, quatorze partidos políticos e o trabalhador continuou na mesma eme. Me admira muito os negos autênticos que hoje estão aí vendo Magalhães Pinto como a salvação!  PÔ, quem é Magalhães Pinto? Quem foi Magalhães? Eu me escudar em Magalhães Pinto como uma bandeira? Sem essa! Sei que ele não é o homem. (EMBORA SINDICALISTA NUNCA FOI TRABALHADOR DE FATO. MAS ACHAVA QUE O HOMEM... ERA ELE, APENAS ELE)


- Quem é o homem? - Quando falo que não sou Arena nem MDB é porque não sou mesmo. Respeito alguns homens do MDB como alguns homens da Arena. Se houvesse possibilidade de criar mais partidos políticos haveria um dilúvio de políticos de ambos os partidos . Prefiro preparar a classe trabalhadora pra saber optar.


- Concordo plenamente. - Mas qual é a opção política no momento? Figueiredo como coisa estabelecida ou Magalhães que pode rachar? - Já pensou na facilidade que nós brasileiros temos de nos amoldar dentro do que os outros determinam pra gente? Determinaram dois caras e nós, ao invés de estarmos brigando por eleições diretas, estamos discutindo qual o mais viável. Essa nossa facilidade de nos amoldar é que faz com que as coisas continuem como estão. Pra mim seria melhor aquele no qual o povo brasileiro votasse, fosse militar, civil, preto, branco ou amarelo!


- Você leu o manifesto do Magalhães? - De manifesto já morri afogado. (É EVIDENTE QUE NÃO LEU O MANIFESTO)  O movimento sindical tem tremendos manifestos. Colocar coisa no papel é muito cômodo, pô, agora vamos pegar a vida real e o que esse homem fez pra ver se merece crédito.


- Lula, como você está vendo a sucessão paulista? - Eu estou vendo como torcedor de futebol que está assistindo a um jogo de dois times de que não gosta. É lógico que eu gostaria que o que fosse escolhido tivesse sensibilidade para o aspecto social.


 - O que você acha da anistia como um caminho agora? - Sou a favor, só que me coloco na minha situação: sou pela anistia da classe trabalhadora, que é quem realmente merece perdão. Nem perdão, merece é liberdade. Sou contra qualquer cidadão estar preso por demonstrar sua ideologia política, mas também acho que a classe trabalhadora é uma eterna prisioneira. Ao invés de pedir anistia pra poucos prefiro pedir pra toda a classe trabalhadora, entende. Um homem que levanta às 4 e meia da manhã e dorme às 10 horas da noite pra ganhar Cr$ 3.000,00 é um eterno presidiário. (1 - DEMAGOGIA SENTIMENTALÓIDE; 2 - EM SEU GOVERNO, TRANSFORMOU O TRABALHADOR EM PRISIONEIRO DAS BOLSAS E CESTAS BÁSICAS; 3 - APÓS SEIS ANOS DE GOVERNO A MAIOR PARTE DOS 'TRABALHADÔ' CONTINUAM A ACORDAR ÀS 4 E MEIA E DORMIR ÀS 10)_


- Mas a anistia aí seria uma medida política. - O trabalhador também não tem participação política. *** - Isso é muito bonito mas soa um pouco demagógico. - Não é não. Foi a minha divergência com a Terezinha Zerbini.


- É, lá no Congresso das Mulheres ela se levantou e pediu pra falar sobre anistia, mas você lhe negou a palavra. - Sofri na carne a prisão de um irmão preso político, mas nem por isso vou passar a brigar pelo meu irmão ao invés de por todo mundo. Quero deixar bem claro que não sou contra a anistia, acho que todo mundo deve voltar a fazer política e defender suas idéias, mas minha anistia, eu quero ela mais ampla. Resolvendo apenas o problema dos cassados, os trabalhadores ficarão do mesmo tamanho: f... e mal pagos. Como sempre estiveram (E CONTINUAM SENDO ATÉ HOJE). Os cassados. Os cassados um dia já tiveram liberdade.

- Mas alguns lutaram pela classe trabalhadora. - Sim, eu cito um exemplo: Marcelo Gatto.   - Eu citaria outro: Miguel Arraes.    - Esse não cheguei a conhecer.  (PARA CONHECÊ-LO BASTARIA LER OS JORNAIS)

 
- Mas o caso da Zerbini. (A MULHER A QUEM ELE NÃO DEU A PALAVRA NO CONGRESSO DAS MULHERES) - A gente estava num congresso aí de mulheres e ela foi lá com uma moção sobre Constituinte e Anistia Ampla, mas o pior é que ela falava nisso e ninguém sabia o que era a palavra “anistia”. No outro dia tinha diretor de sindicato com dicionário na mão!  (MOTIVO POR TER LHE NEGADO A PALAVRA!)

- Mas você disse que o trabalhador não sabia o que era ‘sindicato’. - Alguns trabalhadores sabem, sim. E a prova disso é que o Sindicato dos Rodoviários aqui no Rio formou uma posição a favor: anistiou todos os sócios que estavam em atraso. - O sindicato poderia levantar também essa bandeira da anistia, mas é o tal negócio: tenho certeza de que os caras estão procurando um pezinho pra me pegar. Só não pegaram porque até hoje não saí da área trabalhista. No dia que eu sair me põem a mão.

 
- O grande erro da Terezinha Zerbini e de outros intelectuais brasileiros é querer chegar prum sindicato de operários pra falar de anistia ampla e irrestrita, aí nego não entende nada, pô! - Lula, eu te dei uma paulada no Pasquim porque você repetiu Joãozinho Trinta, dizendo que quem gosta de miséria é intelectual, e que o povo gosta é de luxo. Esse pensamento dele é coisa de bichona, o intelectual procura descobrir as causas da miséria. - Não aceito muito o teórico, por isso conto a coisa prática. Você vai pedir perdão depois que eu contar. Você não viu o Congresso das Mulheres. As intelectuais, as feministas, apareceram lá todas maltrapilhas, até com cabelo no sovaco, pra se identificar com as trabalhadoras. Mas essas apareceram com as melhores roupas delas, com os melhores penteados que podiam fazer, pintadas, com sapato novo... Senti um contraste tremendo: umas lá de cima querendo descer, e as lá de baixo querendo subir. É por isso que eu disse aquilo. (POIS TODOS TÊM O DIREITO DE APARECER, EM QUALQUER LUGAR, DO JEITO QUE QUISER, SEJA POR QUE FOR;  OU O MOTIVO FOI O QUE ALEGOU ANTES:  PORQUE  OS TRABALHADORES NÃO SABIAM O SIGNFICADO DE ANISTIA? DUAS DESCULPAS PARA UM ÚNICO COMPORTAMENTO AUTORITÁRIO)


 - Quando você fala “as intelectuais” está falando de algumas intelectuais. Existem as intelectuais pelegos assim como existem os líderes sindicais pelegos. - É, não posso generalizar. Uma vez meti o pau na Igreja e o Isto É generalizou. Tenho que respeitar um D.Hélder, um D.Paulo, pô. Agora, ninguém tira da minha idéia que a Igreja é conservadora, sendo inclusive responsável pela situação que a classe trabalhadora vive hoje, porque compartilhou com o sistema. Senti que existem alguns intelectuais diferentes; então, quando falo ‘os intelectuais’ não estou generalizando, não. Mas outros intelectuais estão escrevendo a eme sobre os sindicatos. Desçam até as bases para saber como é a coisa pra depois escrever! Conheço alguns intelectuais que escreveram sobre os trabalhadores e, refazendo aquilo, se estreparam mais ainda. Por que? Porque não sabiam o que estavam escrevendo.


 - Não acho que o povo quer o luxo, quer apenas viver melhor . - O povo gostaria de viver bem.


 - O operário italiano tem dois carros. - Olha a sociedade de consumo! - Mas eu que ganho Cr$12.000,00 posso comprar muito mais que um trabalhador que ganha C$ 1.200,00. Se esse mesmo trabalhador ganhasse Cr$ 7.000,00 poderia comer melhor, se vestir melhor, comprar um colchão mais confortável... pô, isso é um direito mínimo do trabalhador! (ADMITE TER MAIS CONDIÇÕES QUE A MAIOR PARTE DOS TRABALHADORES; MAIS ABAIXO SE MOSTRA UM SOFREDOR, COMO NO CASO DA IDA AO JAPÃO)


- Qual deveria ser o salário mínimo? - Em termos específicos não sei, mas seria aquele que deixasse o trabalhador viver.  (RESPOSTA ALEATÓRIA DE QUEM NÃO TEM A MENOR NOÇÃO DE QUANMTO PRECISA O TRABALHADOR)

 - Pagando o seu trabalho com uma sobrevivência digna! - Aquele que desse pro trabalhador tomar leite de manhã, comer carne no almoço, morar numa casa e não numa favela... São Bernardo é o maior centro industrial da América Latina e ¼ da população mora em barracos de favela. E não mora porque quer, não, é trabalhador que não pode pagar aluguel. (HOJE É PRESIDENTE E O SALÁRIO MÍINIMO NÃO MELHOROU EM NADA  E AS FAVELAS CONTINUAM AUMENTANDO)

- Mas você está ascendo socialmente. Está bebendo uísque muito bem, sô! E, antes, o que você bebia? - Olha, se você tivesse colocado aqui uma garrafa de 51 eu tomaria o dobro desse uísque. Bebo o que tiver, né, mas na minha sala do sindicato a gente abre é garrafa de 51.

- Tem alguma coisa que você gostaria de dizer que a gente não te perguntou? - Você abordou um negócio que me preocupa muito: a conotação que se está dando em cima do meu nome. Isso é perigoso pra mim. Talvez eu não tenha estrutura para agüentar a responsabilidade – porque estou sendo responsabilizado – do movimento sindical brasileiro. Porque estou procurando, quando muito, atender às necessidades dos trabalhadores de São Bernardo do Campo.  A covardia dos dirigentes sindicais faz com que, quando uma pessoa abre a boca, ganhe ressonância nacional, mas só quero ser presidente do meu sindicato. Aí em 76 fui o primeiro sindicato a rachar com a Federação. No fim de 76 teve aquele caso da Ford no qual senti a necessidade de tomar uma posição sem consultar os trabalhadores porque sabia que dentro da empresa os chefes conseguiriam coagir os trabalhadores a aceitarem sua determinação. Não aceitei a redução de salário e, a partir daí, o sindicato começou a crescer. (pegando no Vat 69)  Me dá isso aqui, que quando voltar pra São Paulo vai ser 51 mesmo!

 - Mas queira ou não queira você virou uma grande vedete. Saiu da sua classe pra virar um nome nacional, coisa que nenhum torneiro mecânico fez, a não ser o Agnaldo Timóteo. Quais são as dificuldades que você está enfrentando entre seus colegas por estar conversando com os portellas da vida? - Depois dessa do Agnaldo Timóteo já vi que a tendência dos torneiros é ser vedete. Mas tenho total apoio da minha diretoria, com uma confiabilidade à toda prova sobre meus procedimentos. Quando estou aqui, tenho certeza absoluta de que todos eles lá estão me defendendo.

 - Estive conversando com trabalhadores dentro do sindicatos sobre o problema do Lula e do pelego: “Existe a possibilidade de o Lula vir a se tornar um pelego?” Aí o cara me respondeu o seguinte: “Não, porque o sindicato expulsa ele”. - Uma das minhas grandes preocupações é a imprensa. Realmente, tenho medo dela (FALSO MEDO, POIS SABE QUE É JUSTAMENTE A IMPRENSA QUE ESTÁ DIVULGANDO SUA FIGURA). Tenho falado a alguns companheiros da imprensa que existe muita gente boa no movimento sindical e que procurassem eles, porque ficando só a cabeça da gente aí começa a haver uma ciumeira dentro do movimento sindical. Não tenho interesse que só um cara comece a aparecer. Existe muita gente boa no Brasil a quem a imprensa poderia dar a mesma cobertura. Eu não me sinto como uma vedete. Procuro atender bem a quem me procura. Tiro proveito da oportunidade que tenho de falar para os trabalhadores do Brasil. Se amanhã estiver falando outro companheiro meu, terá meus aplausos. O importante é que alguém fale. Somente com alguém falando e o trabalhador sabendo o que está acontecendo é que vai conseguir começar a formar idéias próprias. (PROCURA PASSAR UMA IMAGEM FALSA, POIS EM DIVERSOS TRECHOS DA ENTREVISTAS SE MOSTROU UM FANFARRÃO).

- O que é que você estava fazendo no Japão? - Fui num congresso dos trabalhadores da Toyota, convidado pelos trabalhadores da Toyota de são Bernardo do Campo. Bom, eu estava numa eme danada Sem dinheiro, sem conhecer coisa nenhuma, sem comer aquela comida nojenta do cacete que japonês come... pensei assim: “Antes preso no Brasil do que solto aqui no Japão! Vou embora pra lá”. (NINGUÉM VAI A UM CONGRESSO EM OUTRO PAÍS, SEM CONDIÇÕES DE SE MANTER, ATÉ PORQUE AS MAIORES DESPESAS SÃO PAGAS PELA EMPRESA QUE O CONVIDOU.  E NENHUM DOS JORNALISTAS O CONTESTOU!) 

 - Seu irmão saiu antes ou depois da morte do Vlado? - Ele foi preso dia 4 e Vlado dia 15. Depois que Vlado foi morto ainda ficou mais 60 dias lá dentro.

 - O que você vai fazer quando acabar sua gestão? - Volto pra Villares. A única coisa que aprendi a fazer na vida é ser torneiro mecânico. Acho que todo dirigente sindical, quando sai da direção, deve colocar aquilo que aprendeu em prática dentro das fábricas. O grande mal é que geralmente quando saem se afastam do sindicato.

 - Pra fazer carreira política. - Não, está cheio de dirigentes sindicais derrotados em eleições. Vai ser vendedor. A empresa permite quando muito que continue trabalhando por um ano, porque existe aquela lei, mas acabou a estabilidade mete o pé na bunda do cara, pô, não vai ficar com um ex-dirigente sindical. São raríssimas as empresas que me aceitariam pra trabalhar como torneiro mecânico.



Entrevistadores
Ziraldo, Félix, Chico Jr., Luis Antônio Mello, Ricky,
 Expedito Teixeira, Mário Augusto Jacobskind,
Darwin, Jaguar e Roberto Dutra